Não é novidade que vídeos de maquiagem fazem sucesso no TikTok, especialmente com transições elaboradas e alguma música de fundo. Agora, a “asoka makeup”, maquiagem indiana que pessoas de diversos países estão fazendo enquanto usam roupas e acessórios característicos da Índia, domina a rede social da ByteDance.
Dados do Google Trends mostram que cresceu o interesse por asoka makeup no Brasil a partir do dia 21 de abril, data em que foi publicado o primeiro vídeo que se tornou viral no país. O sucesso também é global. No Trends, as buscas pela tendência aumentaram mundialmente.
Toda tendência nas redes é embalada por uma música que não sai da cabeça. A da vez é a “San Sanana”, trilha sonora do filme “Asoka” (2001) que dá nome à trend. O longa retrata um imperador, interpretado por Shah Rukh Khan, estrela de Bollywood, e a sua amante e guerreira, Kaurwaki, papel de Kareena Kapoor.
Na canção, uma mulher pede para o vento levar alguém tão empoderado quanto ela. “Eu assisti a esse filme quando era criança, nunca imaginei que ia viralizar assim”, diz Shay C, 29, que é filha de indianos e já morou no país durante quatro anos na infância.
Shay criou um perfil no TikTok para comentar e desmistificar os costumes indianos. “Quando estava crescendo, não via uma pessoa como eu, asiática e marrom nas redes sociais, por isso comecei a criar conteúdo”, diz.
Ela amou os vídeos da asoka makeup, mas decidiu não entrar na onda. “Embora a trend seja da cultura indiana, é complicado uma pessoa comum participar porque as transições são extremamente difíceis”, diz.
A criadora de conteúdo Camila Pudim, 27, foi a pioneira em viralizar a asoka makeup por aqui. Ela faz vídeos para o TikTok desde 2018 com a temática de transições de maquiagem.
Camila fez dois vídeos, sendo que o primeiro possui 158 milhões de visualizações, enquanto o segundo soma 364 milhões de visualizações na plataforma, tornando-se o vídeo mais visto da tendência em todo o mundo.
“Ninguém tinha feito isso no Brasil. Eu pensei: ‘vou fazer e ver como vai ser. Postei e deu muito certo. A partir do meu vídeo, o pessoal do Brasil começou a reproduzir e fazer também”, diz Camila, que levou cerca de 14 horas para produzir o conteúdo viral.
Devido ao sucesso dos seus vídeos muitos seguidores começaram a especular quanto ela teria faturado com as reproduções. Ela afirma que já ganhou US$ 1.000 (cerca de R$ 5.000) com o segundo vídeo.
Até mesmo a atriz Juliana Paes entrou na tendência. No Instagram, a intérprete de Maya da novela “Caminho das Índias” (2009), um sucesso que colocou a cultura indiana no imaginário dos brasileiros, gravou um vídeo elaborado, algo que o público já vinha pedindo desde que asoka makeup entrou em alta.
Apesar de ser uma tendência que destaca a maquiagem indiana, o TikTok foi banido na Índia desde junho de 2020, após um conflito armado na fronteira entre o país e a China.
Asoka makeup pode ser apropriação cultural?
Assim como houve debate sobre apropriação cultural quando surgiu com o “asian fishing” –quando uma pessoa não asiática tenta imitar traços asiáticos, seja por meio de maquiagem ou cirurgias estéticas– a discussão também apareceu diante da asoka makeup, que reproduz a maquiagem indiana.
“Na minha percepção, não é apropriação cultural, mas apreciação. Porque as pessoas estão mostrando a cultura indiana”, afirma Shay. “Eles estão mostrando como é a roupa e os acessórios indianos que não são comuns, especialmente no Brasil”, diz ela.
Camila afirma que antes de gravar os vídeos pensou se poderia se enquadrar nesse debate e levou essa discussão aos seus seguidores.
“Não houve nada negativo em relação a isso. Os indianos deixam os comentários mais bonitos nos meus vídeos e acham linda a homenagem”, diz Camila.
Maquiagem indiana como destaque
Nos conteúdos, dois elementos se destacam na maquiagem indiana: os olhos bem marcados, que costuma ser feito com kajal —uma pasta preta em um aplicador pontudo—, e um acessório entre as sobrancelhas chamado de bindi.
Ele é uma espécie de terceiro olho que marca o ponto do chakra (locais que têm mais concentração de energia no corpo) da intuição. O bindi pode ser feito com um pó colorido ou como uma joia —mais utilizados em ocasiões especiais, como o casamento.
Essa ornamentação indiana leva o nome de Aharyam e tem um significado para além do estético.
“Muito dessa maquiagem, joias e roupas vêm das imagens dos deuses, que são extremamente ornamentados”, explica a gaúcha Krishna Sharana, pesquisadora da cultura indiana, professora e coreógrafa de dança indiana, qual pratica desde os anos 1990.
“Para o indiano, esse aspecto é muito importante porque ele acredita que a ornamentação faz parte do divino. É importante para ele adornar a divindade, tal como eles adornam os templos. Isso se estende para o que eles fazem com o corpo deles”, diz Sharana.
No entanto, os indianos não costumam andar tão enfeitados assim no dia a dia, diz a pesquisadora. “Especialmente em casamentos, eles vão até o último grau de ornamentação.”
Sharana reforça que, apesar de a trend exaltar a cultura na Índia, ela mostra só um lado do país que pode ser estereotipado. “Muito do que chega da cultura indiana, inclusive por meio da novela, vem de Bollywood. O que não é ruim. É uma cultura que, inclusive, chega até em Hollywood. Mas, muitas vezes, tem que se cuidar para não ficar só nessa superfície”, diz.
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