No mundo do fisiculturismo, nem sempre é fácil saber quando um corpo desenhado por músculos é consequência apenas de boa alimentação e treino ou tem influência também do uso de anabolizantes. Foi assim que o youtuber Rodrigo Góes viralizou com o meme “fake natty” [natural falso] analisando os competidores do bodybuilding.
Ramon Dino, brasileiro que conquistou na semana passada o segundo vice-campeonato no Mr.Olympia — copa do mundo do bodybuilding— disse em entrevista à Folha que “todo atleta, para chegar naquela performance, tem que ter o uso do anabolizante como ajuda”.
Comum nas academias, a prescrição médica de terapias hormonais com esteroides androgênicos e anabolizantes (EAA) com fins estéticos e para ganho de massa muscular foi proibida pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) em abril.
O país está entre aqueles onde há maior prevalência do abuso de andrógenos no mundo. Segundo pesquisa publicada no portal de periódicos médicos PubMed, se juntam a ele países da Europa e Oriente Médio, além da Austrália, Nova Zelândia e Estados Unidos. O índice é menor em países da África e da Ásia.
Nos EUA, onde é organizado o Mr.Olympia, os esteroides anabolizantes são considerados como Classe III na lei de Substâncias Controladas. A FDA (agência reguladora de alimentos e medicamentos dos EUA) atribui à Classe I os dispositivos com o perfil de risco mais baixo e à Classe III os de maior risco.
No país americano, apenas um pequeno número de anabolizantes é aprovado para uso humano ou veterinário. Os esteroides podem ser prescritos por um médico licenciado para o tratamento de deficiência de testosterona, puberdade tardia, baixa contagem de glóbulos vermelhos, câncer de mama e perda de tecido resultante de infecção por HIV/Aids.
Mas a FDA não aprova indicações para uso por atletas em todos os níveis de esportes, como musculação, levantamento de peso, beisebol, futebol, ciclismo, luta livre e muitos outros que visam melhorar seu desempenho.
Em geral, o uso não chega a ser ilegal nos países, mas não é indicado oficialmente em nenhum, afirma o endocrinologista Ricardo Barroso, diretor da Sbem/SP (Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia Regional São Paulo).
“O uso na maioria das vezes de anabolizante no fisiculturismo é feito pelo mercado negro, com compra em vestiário de academia. Mas, nos últimos anos, vem crescendo a prescrição médica para uso estético”, diz Barroso.
Na Europa, os anabolizantes são classificados como Pieds (drogas para melhoria de desempenho e imagem). Seu uso é predominantemente encontrado entre atletas profissionais e amadores, incluindo entusiastas de fitness e musculação, segundo o EMCDDA (Observatório Europeu da Droga e da Toxicodependência, na sigla em inglês), órgão descentralizado da União Europeia.
Cada estado-membro da União Europeia tem sua própria regulamentação, mas vários aplicam estratégias para prevenir o uso.
Exemplos de práticas incluem o programa da Suécia que visa reduzir o uso de Pieds (100% Pure Hard Training) entre frequentadores recreativos de academia. Além disso, o projeto internacional Erasmus+ Sport —Doping E-learning Tools (Delts) busca melhorar a prevenção e educação em saúde sobre os anabolizantes.
Na Noruega, para complementar o sistema estruturado de tratamento de drogas e superar as barreiras para o engajamento, foi desenvolvido um serviço de suporte telefônico com atuação também nas mídias sociais.
Ainda conforme o observatório, alguns países fornecem orientações sobre a disponibilização de agulhas e seringas para pessoas que injetam os esteroides. No entanto, há poucas evidências da eficácia desses programas.
No Reino Unido, a posse de esteroides não é um crime, mas sua venda ou distribuição, sim, onde estes são incluídos em leis sobre drogas como substâncias de Classe C —categoria de drogas controladas consideradas de menor perigo para a polícia e para campanhas de conscientização sobre danos.
Segundo o EMCDDA, a prevalência do uso de anabolizantes ao longo da vida na Europa foi estimada em 3,8%, sendo um dos mais altos globalmente. De acordo com a Sbem, a taxa de prevalência em todo o mundo é de 3,3% — sendo 6,4% em homens e 1,6% em mulheres.