Um estudo conduzido por pesquisadores da UFG (Universidade Federal de Goiás), em Goiânia, registrou ovos do mosquito Aedes aegypti com a presença dos vírus da zika e chikungunya. Os mosquitos que eclodiram dos ovos também estavam infectados, confirmando que houve a chamada transmissão vertical no animal.
A transmissão vertical ocorre quando os vírus passam dos adultos para as larvas sem a necessidade de um hospedeiro intermediário que, no caso dos mosquitos do gênero Aedes, são os seres humanos.
O artigo descrevendo o achado foi publicado nesta sexta-feira (23) na revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical. Participam da pesquisa especialistas do Centro de Estudos e Pesquisas sobre Agentes (Re)emergentes e do Instituto de Patologia Tropical e Saúde Pública, ambos da UFG, e da Unidade Sentinela e Centro de Referência em Medicina Internacional e de Viagens do município de Goiânia.
Para testar a transmissão vertical, os cientistas coletaram ovos de Aedes aegypti de sete regiões de Goiânia (Central, Norte, Sul, Leste, Oeste, Sudoeste e Noroeste) e os cultivaram no laboratório até a eclosão das larvas. Um total de 1.570 ovos foi coletado, posteriormente separados em 157 reservatórios (poços) com dez indivíduos cada. Eles também separaram por sexo, uma vez que a transmissão dos vírus para os seres humanos ocorre pela picada das fêmeas durante o período reprodutivo.
Após a eclosão, foram realizados testes do tipo PCR (exame molecular que detecta a presença de material genético de outros organismos, semelhante ao exame de Covid) para identificar a presença dos vírus da dengue, zika e chikungunya nas larvas. Dois reservatórios (20 indivíduos) testaram positivo para chikungunya e um para zika.
Para Diego Michel, biólogo e pesquisador responsável pelo estudo, o achado é importante por revelar um mecanismo de transmissão das arboviroses, como são chamadas as doenças transmitidas por mosquito. Embora já fossem conhecidos mecanismos de transmissão similares, pouco se conhecia sobre sua existência em áreas urbanas.
“Pode ocorrer de ovos infectados resistirem a ciclos naturais, como períodos de seca, e aí eclodiram quando vem o período chuvoso, representando então um alerta para a vigilância epidemiológica porque esses indivíduos não precisam procurar hospedeiros humanos para começar a transmissão, eles já são altamente infecciosos”, explica ele, que é também doutorando em Biologia Molecular na UFG.
De acordo com a pesquisa, a transmissão vertical pode vir a ser um problema de saúde pública por facilitar a transmissão da doença para humanos. Não há, porém, registro de quanto tempo os vírus permanecem no organismo dos insetos, afirma Michel.
“Embora não seja possível estimar o tempo exato [de incubação do vírus nos ovos], observamos que ele fica um bom tempo inativo, e os ovos em si podem durar mais de um ano, o que pode apontar a direção para estudos futuros”, disse.
O pesquisador afirma, porém, que embora seja um mecanismo de transmissão natural, seu real impacto no aumento das arboviroses na região é incerto. Na época do experimento, em 2021, o município de Goiânia registrou 141 casos notificados de chikungunya, sendo 106 confirmados e nenhum óbito, e um caso de zika.
“Sabemos que há a possibilidade da transmissão venérea, que é de um mosquito fêmea para outro macho, além de fêmea para as larvas, mas não sabemos o impacto disso. É por isso que os métodos de prevenção do mosquito, como evitar criadouros, água parada, utilização de repelentes e também o monitoramento dessas doenças continuam sendo fundamentais”, lembra.
A pesquisa recebeu o apoio da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) e do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) e contou com a colaboração da Secretaria de Vigilância Sanitária de Goiânia.