Pacientes com Parkinson que apresentam um sintoma conhecido como congelamento da marcha – caracterizado pela perda repentina da capacidade de mover os pés, podendo levar a quedas – acordam mais vezes durante a noite, sentem maior necessidade de dormir durante o dia e apresentam um déficit de movimento dos olhos que pode afetar o sono REM, fundamental para a manutenção das funções cognitivas.
A conclusão é de um estudo apoiado pela Fapesp e conduzido por pesquisadores das universidades Estadual Paulista (Unesp) e de Grenoble (França). Os resultados foram divulgados na revista Sleep Medicine.
Após uma revisão sistemática de 20 estudos sobre qualidade do sono e congelamento da marcha, os autores observaram a correlação entre esses dois sintomas importantes da doença de Parkinson. O achado, segundo eles, pode ser determinante para a criação de novos protocolos de tratamento.
“Havia uma suspeita de que esses dois fenômenos estivessem interligados e a análise dos estudos reforça a hipótese. Isso acontece porque o congelamento da marcha apresenta uma fisiopatologia similar à questão da qualidade do sono [ou seja, os processos fisiológicos que estão alterados são similares]. Os estudos mostram que tanto pacientes com um sintoma quanto com o outro apresentam uma lesão cerebral no núcleo pedúnculo-pontino, região localizada nos gânglios da base”, explica Fabio Barbieri, coordenador do Laboratório de Pesquisa em Movimento Humano (Movi-Lab) e do projeto de extensão “Ativa Parkinson” na Unesp de Bauru.
No entanto, ressalta o pesquisador, ainda não se sabe o que vem primeiro: o congelamento da marcha ou a piora na qualidade de sono. “Os estudos mostram que a chance de um paciente com congelamento da marcha apresentar piora exacerbada na qualidade do sono é acima de 95%. Mas também já se observou que uma piora acentuada na qualidade do sono tende a ser um sinal de que o indivíduo possa desenvolver no futuro o congelamento da marcha. Portanto, são sintomas interligados e ainda não foi possível definir qual surge primeiro”, afirma.
Tratamento
Vale lembrar que a doença de Parkinson afeta o sono de modo geral, independentemente de o paciente apresentar o congelamento da marcha. Em estudo ainda não publicado, o grupo de Barbieri e os colaboradores de Grenoble compararam o efeito da medicação na qualidade do sono.
“Observamos que quando a medicação dopaminérgica é retirada para dormir há uma piora na qualidade do sono”, revela.
Embora não tenha tratamento específico, o congelamento da marcha é um dos principais motivos de queda entre portadores da doença de Parkinson. Junto com tremores e dano cognitivo, o problema é um dos responsáveis pela perda de qualidade de vida entre os indivíduos com a doença.
“O congelamento da marcha não caracteriza um estágio mais avançado do Parkinson. Não é isso, não é todo paciente que vai desenvolver o sintoma, mas está confirmado que ele afeta a qualidade do sono”, conta.
Barbieri explica que o trabalho de revisão foi importante para agrupar diferentes pesquisas e os achados sobre a relação entre congelamento da marcha e qualidade do sono.
“Notamos, por exemplo, que a maioria dos estudos se vale de critérios indiretos para mensurar a qualidade do sono. São medidas que vêm de questionários. Vimos só dois trabalhos que usaram medidas diretas por meio de polissonografia [exame que monitora as variáveis fisiológicas durante o sono] para avaliar a qualidade do sono. O mesmo ocorre com o congelamento do andar. É diagnosticado por meio de questionários. Por esse motivo, estamos iniciando um novo estudo, em parceria com pesquisadores norte-americanos, para tentar monitorar de forma direta o congelamento da marcha”, adianta à Agência Fapesp.
O artigo “Comparison of sleep characteristics between Parkinson’s disease with and without freezing of gait: A systematic review” pode ser lido aqui.