A avaliação feita por adversários e até aliados de que uma vitória de Fernando Haddad (PT) na eleição para o Governo de São Paulo seria uma batalha difícil se consolidou depois que o petista terminou o primeiro turno atrás de Tarcísio de Freitas (Republicanos).
Haddad alcançou 35,7% dos votos válidos ante 42,3% do candidato de Jair Bolsonaro (PL). Desde a redemocratização, a esquerda nunca venceu no estado, e o PT não conseguiu representar um desafio à hegemonia do PSDB.
A pesquisa Datafolha desta sexta-feira (7) mostra que Tarcísio tem 50% das intenções de voto, contra 40% de Haddad. A votação será no próximo dia 30.
Outro entrave para o ex-prefeito de São Paulo e ex-ministro da Educação do governo Lula (PT) é sua rejeição. Segundo o levantamento, 51% não votariam nele de jeito nenhum, contra 39% de Tarcísio.
Ao longo da campanha, Haddad manteve a dianteira nas pesquisas, mas foi derretendo —passou de 52% dos votos válidos em 18 de agosto para 39% na véspera. Já Tarcísio tinha tendência de alta e viu cair uma diferença de 53% a 31% na simulação de segundo turno para 46% a 41% um dia antes da votação.
Seguindo o embalo de terminar em primeiro, a semana foi favorável a Tarcísio em termos de demonstração de força. Na terça-feira (4), ele recebeu o apoio do governador Rodrigo Garcia (PSDB), que amargou a pior derrota de seu partido no estado e terminou em terceiro, com 18,4%.
No campo dos apoios, até integrantes da campanha de Haddad admitem que essa parte da batalha está perdida, já que Bolsonaro e Rodrigo detêm a máquina estatal. Os petistas afirmam que há jogo nos debates, na propaganda de TV e na rua.
A equipe de Haddad quer comparar as biografias e as propostas dos candidatos, além de promover mobilização da militância em atividades pelo estado.
Nas redes sociais, aliados de Haddad passaram a veicular que o apoio de Rodrigo a Tarcísio está ligado ao fato de que o petista, quando prefeito de São Paulo, investigou a máfia do ISS, escândalo no qual o irmão do governador, Marco Aurélio Garcia, foi condenado.
Ao comentar o assunto, Haddad afirmou que a aliança é uma reedição do BolsoDoria de 2018 e vai contra a herança de Mário Covas (PSDB).
Os partidos que compunham a coligação tucana também migraram para Tarcísio em sequência –PP, MDB, União Brasil e Podemos já embarcaram na campanha bolsonarista. Tarcísio recebeu ainda o apoio de Vinicius Poit (Novo), candidato derrotado na eleição para o governo paulista.
O bolsonarista, que conseguiu ampla vantagem de votos no interior, possui a seu lado ainda centenas de prefeitos, que têm migrado em massa para seu entorno. No primeiro turno, Rodrigo teve o apoio declarado de mais de 500 dos 645 prefeitos paulistas e, agora, integrantes das campanhas tucana e bolsonarista dizem ver uma adesão natural a Tarcísio.
Na quinta, Haddad minimizou a questão e declarou que, se apoio de prefeito significasse votos, Rodrigo é quem teria passado para o segundo turno.
O petista também tem uma situação complicada na Assembleia Legislativa de São Paulo. Tarcísio, caso seja eleito, pode ter apoio de pelo menos 52 do total de 94 deputados. Já Haddad teria uma adesão mais facilitada de uma bancada de 30 deputados até agora.
Haddad recebeu os endossos do PDT e do Solidariedade –o primeiro deliberou o apoio nacional a Lula e ao PT, enquanto o segundo já integrava a coligação do ex-presidente.
Por um lado, o petista operou uma inédita união da esquerda já no primeiro turno, com PT, PSOL, PSB, Rede, PC do B e PV, o que ampliou sua campanha. Mas, por outro lado, isso limitou sua expansão de apoios no segundo turno.
Aliados de Haddad afirmam que o candidato se beneficia de forma indireta dos apoios conquistados por Lula no segundo turno, que vão desde Fernando Henrique Cardoso (PSDB) a Simone Tebet (MDB), passando por Ciro Gomes (PDT) e por governadores de diversos estados.
Essa simetria, no entanto, não é perfeita. O principal líder local do MDB, Ricardo Nunes, prefeito da capital, está com Tarcísio. E tucanos históricos que aderiram a Lula, como José Serra, declararam apoio ao bolsonarista em São Paulo e não a Haddad.
Em São Paulo, tucanos estão divididos entre quem apoia Lula/Haddad e quem apoia Bolsonaro/Tarcísio, mas a parcela que defende Lula/Tarcísio é expressiva. Seu argumento é o de que a esquerda não pode assumir o Governo de São Paulo e que Tarcísio é um técnico, que não teria a ideologia bolsonarista.
Nesse terreno, um ativo que a campanha de Hadadd tem buscado é o apoio formal do diretório municipal do PSDB em São Paulo, algo que não é impossível, segundo os próprios tucanos.
O movimento de aproximação na semana passada veio após uma parcela do partido condenar o apoio de Rodrigo a Bolsonaro, uma ação pessoal do governador que não foi costurada antes com líderes do PSDB.
Os estrategistas de Haddad têm depositado esperança na campanha de Lula com o plano de que os dois candidatos dividam comícios e apareçam juntos na TV. Desde quinta (6), foram três agendas conjuntas –caminhadas em São Bernardo do Campo, Guarulhos e Campinas.
A ideia é que o candidato a vice-presidente, Geraldo Alckmin (PSB), fique concentrado em São Paulo no segundo turno.
Mesmo esse caminho, contudo, é pedregoso para Haddad. No estado, Lula perdeu para Bolsonaro –40,9% a 47,7% dos votos válidos.
A campanha do ex-presidente considera São Paulo um ponto crítico e que requer atenção –a adversidade no Sudeste se ampliou com o apoio dos governadores de Rio, Minas e São Paulo a Bolsonaro.
Há ainda cobranças e acerto de rota entre as duas campanhas. Como a Folha mostrou, a equipe de Haddad foi criticada pela equipe de Lula pelos ataques a Rodrigo e a menor artilharia contra Tarcísio no primeiro turno.
Os lulistas cobravam ataques mais fortes em Tarcísio para fragilizar o palanque de Bolsonaro. Além disso, havia a expectativa de que, se a campanha do PT amenizasse as críticas ao governador, o tucano viesse a apoiá-los em um segundo turno.
Questionado sobre a discórdia, Haddad afirmou que apenas criticou Rodrigo para reagir à campanha de Edson Aparecido (MDB), candidato ao Senado na chapa tucana que veiculou peças contra o petista.
Nesta segunda etapa da campanha, Haddad terá ainda como obstáculo a intensificação dos ataques contra ele e o PT –que acabaram em parte poupados dada a disputa paralela entre Tarcísio e Rodrigo.
Na campanha bolsonarista, o plano é explorar a rejeição de Haddad na prefeitura e apontar ainda o resultado de administrações petistas em outras cidades do estado.
A equipe de Haddad pretende responder com a votação do petista na capital (44,38% ante 32,56% de Tarcísio) para esvaziar o discurso de má gestão na prefeitura. Em 2016 e 2018, no entanto, Haddad perdeu na cidade.
Como contra-ataque, os petistas devem questionar o volume de entregas de Tarcísio como ministro em São Paulo.