A cantora Preta Gil divulgou no último domingo (25) que o câncer colorretal que havia tratado no ano passado voltou —processo conhecido como recidiva, quando a doença retorna após um período de tratamento bem sucedido.
Agora, o tumor evoluiu para uma metástase, quando sai do local inicial e se espalha pelo corpo. No caso da cantora, está em quatro locais: em duas estruturas do sistema linfático, conhecidas como linfonodos; no peritônio, uma membrana que reveste órgãos como intestino, fígado e estômago; e no ureter, tubo por onde passa a urina.
Mesmo com um tratamento inicial bem executado, ainda existe risco de retorno da doença, especialmente em casos de câncer avançado.
“Ela é uma paciente extremamente otimista, e isso ajuda no tratamento”, afirmou o cardiologista Roberto Kalil à Folha, um dos médicos que acompanha o tratamento contra o câncer de Preta Gil.
Segundo o cirurgião oncológico Rodrigo Nascimento Pinheiro, presidente da SBCO (Sociedade Brasileira de Cirurgia Oncológica) e titular do Hospital de Base, em Brasília, a recidiva pode ser mais “desafiadora” de tratar do que o câncer inicial, porque indica um comportamento biológico mais “agressivo” da doença.
“Esse tratamento adicional pode ser mais custoso em termos de qualidade de vida e também em complexidade. Além disso, os resultados dos tratamentos para recidivas não são tão eficientes quanto o tratamento inicial”, afirma.
Pinheiro explica que quanto mais tratamentos forem necessários, a tendência é que as chances de sucesso sejam menores.
“Contudo, isso não significa que o tratamento não vá funcionar; há casos em que os resultados podem ser completamente satisfatórios e eficazes”, diz.
De acordo com dados de 2014 a 2020 da ACS (American Cancer Society), vinculada ao Instituto Nacional do Câncer dos Estados Unidos, apenas 15% dos pacientes com câncer colorretal metastático —caso da cantora Preta Gil— vivem por pelo menos cinco anos após o tratamento.
Se a doença ficar restrita ao órgão original acometido, a taxa de sobrevivência após cinco anos é de 91%.
Esse é o tempo utilizado para mensurar o período de remissão, quando há chances de novas células cancerígenas serem encontradas. Após esse tempo, o risco diminui consideravelmente.
No Brasil, não existem dados específicos sobre o número de pessoas afetadas por câncer colorretal ou a taxa de sobrevivência após a remissão. Apenas é registrado o número total de pessoas com câncer, sem distinção do tipo, e o número de óbitos pela doença.
Embora os dados americanos sejam um ponto de partida relevante, o radio-oncologista Gustavo Nader Marta, presidente da SBRT (Sociedade Brasileira de Radioterapia), afirma que é importante considerar as diferenças no contexto brasileiro, como acesso ao tratamento e infraestrutura de saúde.
“As condições do sistema de saúde nos Estados Unidos são diferentes das do Brasil. É um contexto em que muitos pacientes têm acesso a diagnósticos precoces, tratamentos de alta qualidade e cuidados contínuos, o que pode não ser uma realidade universal no Brasil, especialmente para a população totalmente dependente do SUS [Sistema Único de Saúde]”, explica.
Segundo Marta, o Brasil enfrenta desafios adicionais, como desigualdade no acesso aos tratamentos e barreiras logísticas que podem afetar a sobrevida dos pacientes.
“Por outro lado, no Brasil, existem centros de excelência em oncologia, que oferecem tratamentos comparáveis aos melhores centros dos Estados Unidos. Nesses casos, as taxas de sobrevida podem ser mais semelhantes às reportadas”, diz.
De acordo com a SBCO, o câncer colorretal, que acomete o intestino grosso e reto, é um dos mais incidentes na população brasileira, com 45 mil novos casos previstos para 2024.
Um estudo publicado em 2023 na revista científica JAMA Oncology mostra que pacientes em remissão de câncer colorretal têm menos chance de recidiva da doença em comparação com 20 anos atrás.
Pinheiro explica que é fundamental seguir um protocolo de monitoramento após o tratamento de câncer inicial para investigar a chance de recidiva.
O protocolo inclui exames de imagem e de sangue específicos para buscar sinais, além de uma “busca ativa” para detectar qualquer retorno.
“Diagnósticos precoces aumentam as chances de um tratamento mais eficaz”, afirma.