Amazônia e cerrado ardem, cobrindo mais da metade do Brasil com um manto de fuligem. Entre as grandes cidades do mundo, São Paulo tem a pior qualidade do ar. Rio Branco, no Acre, sufoca com o dobro de poluentes da capital paulista.
Diante do sinistro ambiental e de saúde, o país descobre que a mangueira do Estado para debelar as chamas está furada. Isso quando não a utiliza para deitar mais combustíveis fósseis na fornalha da mudança climática.
De um Congresso de onde só se esperam coisas ruins veio isso mesmo. Os 290 deputados e 50 senadores da Frente Parlamentar da Agropecuária fingiram não saber que a culpa pelas queimadas é do agro e cobraram explicações da titular do Meio Ambiente, Marina Silva (Rede).
Ela as deve, por certo, como todo ocupante de cargo público. Mas até o carpete do Salão Verde danificado no 8 de janeiro por simpatizantes da bancada ruralista sabe que a ministra é uma das poucas na Esplanada a fazer algo contra os incêndios.
A incongruência mora no Planalto. Luiz Inácio Lula da Silva (PT) deu para posar de bombeiro, mas o que o presidente diz e faz na encruzilhada da floresta e do clima mostra que sua disposição para apagar a fogueira do aquecimento global é tão confiável quanto a liderança de um ex-coach debaixo de chuva no Pico dos Marins.
Lula sacou do bolso uma pseudossolução para a míngua do rio Madeira, que pela primeira vez em seis décadas exibe menos de 1 m de profundidade e isola ribeirinhos: asfaltar a rodovia BR-319 (Porto Velho-Manaus). Como na BR-163 (Cuiabá-Santarém), rasgará uma frente de desmatamento por madeireiros e grileiros piromaníacos.
Seus ministros das Relações Exteriores e da Agricultura mandaram carta à União Europeia, enquanto amazônia e cerrado queimavam, defendendo o agronegócio incendiário. Pedem adiamento do Regulamento para Produtos Livres de Desmatamento, que vigoraria em dezembro e afetaria 30% das exportações à UE.
Nada se compara, porém, com a obsessão varguista de Lula e do PT com o gigantismo da Petrobras e a exploração de petróleo e gás na margem equatorial da amazônia. O pretexto é usar a renda dos fósseis para financiar a transição energética, uma balela.
Levantamento da ONG Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) noticiado pela coluna Painel S.A. indica que empresas do setor petroleiro se beneficiaram com uma renúncia fiscal de R$ 260 bilhões de 2015 a 2023. Só a Petrobras foi agraciada com R$ 117 bi (R$ 13 bi/ano).
Por outro lado, a estatal tem planos de aplicar US$ 5,2 bi (R$ 29,2 bi) em energias renováveis até 2028. Isso dá R$ 5,8 bi/ano, menos da metade do que vem sugando de subsídios na forma de impostos reduzidos —isso numa década em que a alta finança impôs ao país uma obsessão com equilíbrio fiscal à custa de gastos sociais.
Resumo da ópera: nem o governo Lula, nem o Estado brasileiro como um todo, tem um plano de ação coerente para descarbonizar a economia e mitigar o aquecimento global, seja estancando a maior fonte de emissões de carbono (desmatamento e queimadas do agro), seja abandonando a ideia fixa do petróleo.
Prometer desmate zero em 2030 é tão fácil quanto descumprir essa meta.
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