A sobrevivente de um abuso sexual pode processar a Visa por vídeos dela publicados no site Pornhub, segundo decisão de um tribunal dos Estados Unidos.
Serena Fleites tinha 13 anos em 2014 quando, segundo ela, um namorado a pressionou para fazer um vídeo de sexo que ele publicou no Pornhub.
Fleites alega que a Visa, ao processar a receita de anúncios, foi cúmplice da MindGeek, empresa controladora do Pornhub, para ganhar dinheiro com os vídeos do abuso sofrido por ela.
A Visa tentou ser retirada do caso.
A história de Fleites foi contada no artigo The Children of Pornhub — texto publicado no New York Times que levou a MindGeek a excluir milhões de vídeos e fazer mudanças significativas em suas políticas e práticas.
As acusações dela estão resumidas na decisão pré-julgamento do Tribunal Distrital Central da Califórnia.
Milhões de visualizações
O vídeo explícito original, publicado no Pornhub sem o conhecimento ou consentimento dela, teve 400 mil visualizações quando ela o descobriu, diz Fleites.
Ela alega que, depois de tomar conhecimento do vídeo, entrou em contato com a Mindgeek fingindo ser a mãe dela “para informar que o vídeo era qualificado como pornografia infantil“. Algumas semanas depois, ele foi removido.
Mas o vídeo foi baixado pelos usuários e reenviado ao site várias outras vezes, com um dos reenvios visto 2,7 milhões de vezes, ela argumenta.
Ela alega que a MindGeek obteve receita publicitária desses novos uploads.
Fleites diz que a vida dela “saiu do controle” — ela tentou por diversas vezes tirar a própria vida e as relações familiares se deterioraram. Então, quando ela morava na casa de um amigo, um homem mais velho a apresentou à heroína.
Para financiar o vício dela, ainda criança, Fleites criou outros vídeos de sexo explícito, a pedido desse homem, alguns dos quais foram enviados para o Pornhub.
“Enquanto a MindGeek lucrava com a pornografia infantil com a Autora. A Autora era intermitentemente sem-teto ou morava no carro dela, viciada em heroína, deprimida e suicida, e sem o apoio da família”, diz o resumo das alegações do juiz Cormac J. Carney.
A MindGeek disse à BBC que, neste momento, o tribunal ainda não decidiu sobre a veracidade das alegações e é obrigado a assumir que todas elas são verdadeiras e precisas.
“Quando o tribunal puder realmente considerar os fatos, estamos confiantes de que as reivindicações da autora serão rejeitadas por falta de mérito”, disse a empresa.
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‘As ferramentas para executar o crime’
O juiz decidiu que, no atual estágio do processo, “o Tribunal pode inferir uma forte possibilidade de que a rede da Visa estivesse envolvida em pelo menos algumas transações publicitárias relacionadas diretamente aos vídeos da Autora”.
Mas a Visa argumentou que “a alegação de que a Visa reconheceu a MindGeek como um comerciante autorizado e processou o pagamento em seus sites não sugere que a Visa concordou em participar de qualquer tipo de tráfico sexual”.
Também argumentou, de acordo com o relato do juiz sobre seu posicionamento, que uma relação comercial por si só não configura conspiração.
Mas o juiz Carney disse que, novamente nesta fase do processo, “o Tribunal pode inferir confortavelmente que a Visa pretendia ajudar a MindGeek a monetizar a pornografia infantil pelo próprio fato de que a Visa continuou fornecendo à MindGeek os meios para fazê-lo e sabia que a MindGeek estava de fato fazendo isso”.
“Em outras palavras, a Visa não é acusada de simplesmente ter criado um incentivo para cometer um crime, é acusada de ter fornecido conscientemente a ferramenta usada para completar um crime.”
Um porta-voz da Visa disse à BBC que a empresa condena o tráfico sexual, a exploração sexual e o material de abuso sexual infantil.
“Esta decisão pré-julgamento é decepcionante e descaracteriza o papel da Visa e suas políticas e práticas. A Visa não tolerará o uso de nossa rede para atividades ilegais. Continuamos acreditando que a Visa não deveria ser ré neste processo.”
No mês passado, o diretor-executivo e diretor de operações da MindGeek pediu demissão.
As saídas dos diretores aconteceram logo após a repercussão negativa na imprensa, com um artigo da revista The New Yorker, examinando, entre outras coisas, as políticas de moderação da empresa.
A Mindgeek disse à BBC que adota “tolerância zero para a publicação de conteúdo ilegal em suas plataformas-baniu uploads de pessoas que não tenham enviado uma identificação emitida pelo governo que passe pela verificação de terceiros”.
Além disso, a empresa diz que “eliminou a possibilidade de baixar conteúdo de graça-integrou várias plataformas tecnológicas e ferramentas de moderação de conteúdo-instituiu a impressão digital de todos os vídeos que violam as Políticas de Conteúdo Não Consensual e CSAM (material de abuso sexual de menores, por sua sigla em inglês) para ajudar a proteger contra a republicação de vídeos removidos-aumentou sua força de trabalho e processos de moderação”.
A empresa também alegou que qualquer insinuação de que ela não leva a sério a exclusão de material ilegal é “categoricamente falsa”.
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