O diretor Deniz Yorulmazer, com ajuda do roteirista Hakan Bonomo, deu uma repaginada em um sucesso turco de 1986 e trouxe de volta ao público “Ah, Belinda”, uma comédia dramática carismática sobre a identidade feminina. No enredo, a talentosa Neslihan Atagül interpreta a protagonista Dilara, uma mulher independente, cheia de personalidade, que trabalha como atriz e tem sua rotina cheia de coisas que a satisfazem, como passar tempo com o namorado, Serkan (Serkan Çayoglu), e sair com os amigos, entre eles a colega invejosa, Arzu (Beril Pozam).
Quando ela assina um contrato para fazer uma propaganda de xampu, as coisas fogem um pouco de seu controle. Tudo começa quando Dilara lê sobre a personagem que terá de interpretar: uma dona de casa e bancária que tem dois filhos, divide sua rotina entre sua vida profissional e seu lar e mal tem tempo para si mesmo. Handan, a personagem, é tudo que Dilara mais despreza em uma mulher. É alguém que desiste dos próprios sonhos e objetivos para atender às expectativas da sociedade, para se tornar propriedade de um casamento e de uma vida esvaziada de identidade. Ela tenta cancelar o contrato para o comercial, mas a multa pode simplesmente a levar à falência. Então, ela decide realizar o trabalho.
No dia de gravação, Dilara conhece o ator que interpretará seu marido, Necati (Necip Memili), um homem pegajoso e inconveniente, que passa o tempo todo a paquerando. Com dificuldades de encarnar Handan, Dilara tem um longo e cansativo dia de filmagem. Até que em uma cena, enquanto lava o cabelo, é transportada para um universo alternativo onde ela é Handan. Dilara tenta explicar para o marido, Necati, que na realidade ela é uma atriz e que aquela não é sua vida. Enquanto as crianças gritam, pulam e correm pela casa, Dilara encara o vazio tentando se encontrar em meio aquela realidade completamente alterada. No dia seguinte, seu telefone toca e ela descobre que está atrasada para o trabalho no banco. Seu namorado, Serkan, não a reconhece. Outra pessoa mora em seu apartamento. Sua vida, como ela conhecia, não existe mais. Para piorar, Dilara descobre que Handan tem um caso com seu chefe, com quem junta dinheiro para fugir.
Mas Dilara é uma mulher teimosa e persistente, que quer fazer as pessoas enxergarem quão absurda é toda a situação. Mas, claro, que logo ela será tratada como alguém que está passando por ataque psicótico e tendo ilusões sobre sua vida e será internada em uma clínica psiquiátrica. Mas é lá que ela tem um encontro com uma espécie de “fada madrinha” que parece saber o que está acontecendo e lhe dá conselhos vagos, como o Mestre dos Magos.
Então, Dilara decide encarnar de vez Handan, convencer os psiquiatras de que ela está bem para voltar para casa. De volta à convivência com Necati e os filhos, ela decide finalmente se tornar a dona de casa que todos pensam que ela é. Mesmo assim, Dilara faz testes para encenar um papel na peça de teatro em que atuava antes de ser transportada para essa situação surreal.
“Ah, Belinda” é uma história tão rica, que daria muito mais tempo de filme que seus 97 minutos. Havia tanto para se explorar, como a relação de Handan com a cunhada, o caso extraconjugal com o chefe e a amizade conturbada de Dilara com Arzu. Mas Yorulmazer tentou enxugar bastante e não deixar sobras. Neslihan Atagül, que interpreta a protagonista, está extraordinária em seu papel e conduz todo o filme com muito charme e desenvoltura, provando seu talento.
A comédia é gostosa, tem boas cenas de humor e é bastante dinâmica, não sendo nada cansativa para quem assiste. “Ah, Belinda” é sobre mulheres presas em vidas que não as pertence e sobre compreender o que a outra vive, mesmo que as escolhas dela sejam bem diferentes da sua. Muitas mulheres não conseguem se colocar no lugar de outras. Se você quer conhecer um pouco mais do cinema turco, essa é uma ótima produção e que vai te cativar.
Filme: Ah, Belinda
Ano: 2023
Direção: Deniz Yorulmazer
Gênero: Comédia / Drama
Nota: 7/10