Dona de um sorriso contagiante, Lia de Itamaracá, a mais célebre cirandeira do Brasil, está recebendo o devido reconhecimento por sua contribuição na cultura brasileira no auge dos seus 79 anos de idade — e não somos nós que estamos afirmando isso.
Beto Hees, produtor de Lia há mais de 20 anos, disse ao TMDQA! que. depois de muito persistir, a compositora e cantora pernambucana está vivendo “um momento grandioso de reconhecimento” e, com orgulho, reforça que “nada disso foi concedido, foi conquistado”.
O relato de Hees surge após Lia de Itamaracá ser anunciada como a artista homenageada da terceira edição do Troféu Tradições, realizado pela União Brasileira de Compositores (UBC).
A cerimônia, que também contará com o novo show de Lia intitulado “A Ciranda no Mundo”, acontecerá nesta terça-feira, 6 de Junho, na Casa de Francisca, localizada no Palacete Teresa, em São Paulo, e terá transmissão ao vivo pelo canal da UBC no YouTube.
Lia de Itamaracá é homenageada pelo Troféu Tradições
Lia de Itamaracá é a terceira compositora a ser homenageada com o Troféu Tradições. Em 2021, na primeira edição do prêmio que busca valorizar e enaltecer grandes artistas fundamentais para a música brasileira, a UBC celebrou Anastácia, conhecida como “Rainha do Forró”, e no ano seguinte foi a vez de Dona Onete, fenômeno do Carimbó.
Este ano, a UBC manteve sua tradição de homenagear as artistas ainda em vida, o que a Rainha da Ciranda destacou ao TMDQA! que considera de extrema importância. Sobre ser escolhida para o prêmio, ela disse:
Pra mim é mil maravilhas! Eu adoro ser homenageada, ainda mais quando vem de coração. E o que eu gosto é de ser homenageada com vida. A UBC me escolheu para ser homenageada e eu estou muito grata, graças a Deus e graças a vocês, e eu vou me sentir muito bem.
Lia, que é Patrimônio Vivo de Pernambuco e Doutora Honoris Causa pela Universidade Federal de Pernambuco, irá receber a honraria das mãos da cantora e Diretora Presidente da UBC, Paula Lima, nesta terça-feira.
Como falamos acima, além do prêmio, a cirandeira irá apresentar seus grandes sucessos, como “Desde Menina”, “Meu São Jorge”, “Eu Sou Lia Minha Ciranda Preta Cirandeira”, “Dorme Pretinho” e mais, em um show que contará com participações especiais da sambista Tereza Cristina, da cantora baiana Daúde, que já dividiu os palcos com Lia, e do rapper Rincon Sapiência, que gravou o single “Moça Namoradeira” apresentando a um novo público um sample da música de mesmo nome da artista pernambucana.
A homenagem de Lia de Itamaracá no Troféu Tradições acontece depois da artista ter marcado presença no Prêmio Profissionais da Música (PPM) no último final de semana, em Brasília, como destaque da modalidade “Educação”.
No PPM, a cantora foi reconhecida por sua trajetória artística e por sua atuação na difusão da Ciranda no Brasil e ao redor do mundo.
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Lia e o amor pela Ciranda
Acompanhando sua dedicação à Ciranda, Maria Madalena Correia do Nascimento, nome de batismo de Lia, foi cozinheira do Bar Sargaço, na praia de Jaguaribe, uma das mais populares na Ilha de Itamaracá, e também trabalhou em uma escola pública como merendeira, função que exerceu até se aposentar.
A cantora conta que, desde muito nova, se interessou pela música. Mesmo tendo dezoito irmãos, apenas ela embarcou na vida artística:
Olhe, todo o meu sonho era cantar. O dom que eu tenho quem me deu foi Deus. Eu venho de uma família de dezoito irmãos comigo, mas nenhum interessou-se pela música, só eu que me interessei pela música. Ainda chamei um dos meus irmãos, meu sobrinho, pra ver se me acompanhavam, mas eles disseram pra mim que a cabeça não dava; pois a minha dá. E segui meu trabalho, meu sonho, realizei e estou realizando. É o que eu gosto de fazer, e amo fazer e estou feliz.
Além da Ciranda, Lia também cresceu sendo influenciada por outros movimentos tradicionais de Pernambuco como o Maracatu, o Coco e muitos outros que ela destaca como ferramentas potentes de transformação social.
Ao comentar sobre a importância dessas manifestações, a cantora aproveitou para mandar uma mensagem para as autoridades que não valorizam seu trabalho:
A Ciranda, o Coco, o Maracatu, o Frevo, tudo isso é contagiante. É um amor. Eu adoro. [Estou] levando a cultura pro mundo. É onde ela está, no mundo. Eu estou levando pro mundo. Apesar do meu lugar ninguém valorizar, as autoridades, os gestores, não querem ajudar a chegar, né? Mas é problema deles. Eu estou fazendo a minha parte e estou mostrando a eles o que eu posso fazer: a minha parte. Que eles não demorem a chegar perto de mim com a parte deles, não esperem eu morrer. Se vai colaborar, [que seja comigo] viva, eu viva. Depois que eu morrer não me adianta fazer mais nada, que nada eu vi. E o que eu tive de ver, eu já vi e quem tinha que me apoiar, já apoiou e está apoiando ainda.
Encontro com Jon Batiste e a valorização da Ciranda
Apesar de sentir falta do apoio de seu próprio estado e também do Brasil de uma maneira geral, Lia teve recentemente um encontro com o músico norte-americano Jon Batiste que lhe proporcionou uma demonstração importante da valorização de sua carreira enquanto Rainha da Ciranda.
O produtor Beto Hees fez questão de apontar que a participação especial de Lia na performance de Batiste, que aconteceu no festival C6 Fest tanto no Rio de Janeiro como em São Paulo, aconteceu após ela ter sido convidada pelo próprio músico:
Foi um convite dele, foram eles que bancaram todos os custos: o cachê de Lia, hospedagem, viagem, diária de alimentação e, diga-se de passagem, foi o melhor cachê que Lia ganhou durante toda a sua vida de artista, foi de um artista americano que a convidou.
Acho que é interessante ressaltar isso da valorização que a artista popular, uma mulher negra, de uma ilha pequena, nordestina, não tem no país dela, e vem um artista de outro país e dá a ela toda a dignidade que uma artista, mulher, preta, de oitenta anos, há sessenta anos trabalhando, finalmente tem. A gente briga tanto aqui pra conseguir e vem concedido por alguém de fora. [Que possa] servir de exemplo e, inclusive, esse cachê serve para a gente justificar os nossos cachês aqui e tentar aumentá-los.
Hees ainda revelou que estava em contato com Jon Batiste há cerca de um ano e meio, pois o músico descobriu Lia pela internet e lhe enviou uma mensagem dizendo que gostaria de um dia colaborar com a cantora.
Ele até a convidou para participar de um show no Carnegie Hall, em Manhattan, em Nova York. Porém, o produtor disse que a parceria acabou não acontecendo por causa da pandemia, mas a presença do pianista no C6 Fest chegou para mudar isso.
Durante o show explosivo de Batiste, o encontro entre ele e Lia conquistou todos que estavam no evento. Sobre esse momento, Lia relembrou:
Eu não conhecia ele, ele também não me conhecia. Mas o nosso encontro foi maravilhoso. Parecia que a gente já se conhecia há muito tempo. A troca no palco foi muito bonita, muito, muito, muito mesmo.
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Lia de Itamaracá também terá a oportunidade de ver sua arte ganhando o devido enaltecimento no ano que vem, depois de completar 80 anos de idade em 12 de janeiro.
A cirandeira será enredo no Carnaval 2024 das escolas de samba Império da Tijuca, no Rio de Janeiro, e da Nenê de Vila Matilde, em São Paulo. Sem revelar se irá participar dos desfiles, Lia comentou sobre ser tema das duas escolas e sua alegria em ser celebrada:
Estou preparadíssima para receber essas duas homenagens. Duas escolas da pesada, boas, não é? Para mim é mil maravilhas ser homenageada por essas duas escolas. Pra mim é sensacional. Quanto mais festa Lia vê, mais festa Lia gosta. Mais homenagem vem, mais homenagem Lia gosta. Eu adoro ser feliz e fazer os outros também serem felizes.
Discos de Lia de Itamaracá
Em 2019, Lia lançou seu disco mais recente, Ciranda sem Fim, que teve produção musical de DJ Dolores e apresentou em seu repertório a mistura entre os ritmos tradicionais dos trabalhos da cantora junto com beats eletrônicos, guitarra e bateria.
Sobre o álbum ter aproximado Lia de um público mais jovem e garantido sua presença em festivais, onde também apresenta sua história com a Ciranda para mais pessoas, a artista declarou:
Eu vejo uma alegria muito grande. E sinto também nos jovens de hoje, não é? A mocidade incentivando o meu trabalho, se interessando a aprender também, quer dizer que o meu trabalho não está só comigo, está com o mundo todo, com meus fãs, os estudantes, não é? Os jovens de hoje que querem aprender alguma coisa, entrem em contato com a Lia, me sigam.
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Sobre o próximo trabalho de Lia de Itamaracá, Beto Hees revelou que eles estão trabalhando em parceria com a cantora baiana Daúde, que se tornou uma grande amiga dele e de Lia nos últimos anos.
Homenagem a Lia de Itamaracá no Troféu Tradições UBC
Como falamos acima, o público vai poder conferir um pouco desta parceria entre Lia e Daúde na cerimônia do Troféu Tradições que acontece nesta terça-feira (6).
O evento será na Casa de Francisca e ainda está com as vendas abertas. Você pode garantir os ingressos, que vão de R$80 a R$196, por aqui.
SERVIÇO
TROFÉU TRADIÇÕES UBC
Terceira edição: Homenagem a Lia de Itamaracá
Data e horário: 06 de junho, às 21h30
Local: Casa de Francisca (R. Quintino Bocaiúva, 22 – Sé, São Paulo – SP)
Vendas: Pixel Ticket
Transmissão ao vivo através do Youtube da UBC
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