O filme da Barbie, recheado de mensagens positivas de autoaceitação, mal saiu de cartaz nos cinemas e já inspira novos procedimentos estéticos que miram a aparência irreal da boneca de plástico. É o caso do BarbieBotox, nome dado à aplicação de toxina botulínica no músculo trapézio para diminuí-lo e dar impressão de um pescoço mais alongado e fino.
Já são milhões de postagens nas redes sociais sob a hashtag “BarbieBotox”, seja de dermatologistas e cirurgiões plásticos explicando o procedimento e exibindo a prática em seus pacientes ou de jovens mulheres mostrando os efeitos das injeções com direito a antes e depois.
A influenciadora Gkay, 30, após dizer no ano passado que pararia com as plásticas por estar satisfeita com o resultado das intervenções, é uma das adeptas.
“É o oposto da academia”, diz Rafael Pessanha, cirurgião plástico que fez o procedimento em GKay. “A ideia da toxina é diminuir.”
Não é imperceptível, mas está longe de causar o impacto de uma lipoaspiração LAD, outro procedimento que ganhou as redes sociais com registros de antes e depois.
Segundo o cirurgião plástico Jardis Volpe, que acumula 1,6 milhão de seguidores no Instagram, o procedimento é popular entre mulheres —e ele atribui a procura pelo tal pescoço fino ao filme “Barbie”. Ele diz que, apesar de ser moda fora do Brasil, a tendência ainda não chegou com tanta força aos consultórios daqui e costuma ser procurada por pessoas mais jovens.
A Barbie virou um padrão de beleza a ser seguido desde sua chegada ao mercado, em 1959. Ela foi, segundo Ana Lúcia Castro, antropóloga e professora da Unesp (Universidade Estadual Paulista), a quebra de um ciclo de bonecas infantilizadas e assexuadas para uma boneca adulta na qual as meninas poderiam se inspirar.
“A Barbie é um ícone da cultura de culto ao corpo que impacta a subjetividade feminina”, diz ela. “Ela tem medidas que, transportadas para a realidade, são humanamente impossíveis.”
A cabeça acoplada a um pescoço longo e fino é uma dessas características pouco humanas. Mas a busca continua.
No “Botox da Barbie”, a impressão de alongamento se dá porque o uso da substância na região atrofia o músculo, diz o cirurgião Jardis Volpe. A toxina diminui ou paralisa a contração muscular por bloquear a acetilcolina, um mecanismo neurotransmissor, na junção entre o tecido e as terminações nervosas. Isso causa um efeito de atrofia e “afinamento”, com redução do volume.
Apesar do cosmético viver uma explosão nas redes, Eliza Minami, da SBCP (Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica), diz que a aplicação da toxina botulínica nos ombros não é novidade, mas era usada para tratamento de doenças, como dor miofascial, distonia cervical (espasmos e contrações dos músculos do pescoço) e enxaqueca.
O uso para o tratamento da enxaqueca, por exemplo, é amplamente aceito por neurologistas. Desde 2010 o uso é regulamentado pela FDA (órgão regulador de medicamentos dos Estados Unidos), e desde 2014 pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária).
Os efeitos visuais, porém, são milimétricos, segundo a neurologista Vanessa Milanese. Ela diz que em pacientes com muita contração muscular a mudança é percebida ao apalpar a região. A aplicação, diz a médica, exige cuidado, uma vez que o trapézio é um músculo grande, que vai da base da cabeça até os ombros.
Além disso, ela afirma que o procedimento depende de outros fatores, como hérnias de disco e avaliação geral da coluna. São aplicadas entre 15 e 30 injeções de cada lado. Pessanha afirma que a dose aplicada vai depender da força da musculatura.
Minami diz que os efeitos duram de 3 a 5 meses, mas avalia que o uso estético deve ser limitado a casos de hipertrofia do músculo. “Não é um tratamento de rotina na nossa prática clínica. É mais comum para finalidades terapêuticas”, afirma.
A médica pontua que, se aplicado em doses muito altas, pode causar fraqueza na musculatura que sustenta o pescoço, mas diz que a literatura especializada relata poucos efeitos colaterais. Todas as contra indicações da toxina botulínica valem para essa aplicação: nada de uso em gestantes e lactantes, nem alérgicos ou portadores de doenças neuromusculares.
Volpe chama atenção para o fato de que a paralisação de algumas áreas, caso do trapézio, pode sobrecarregar músculos acessórios nas costas.