Quando o bebê Francisco apresentou, em junho deste ano, os primeiros sintomas que se assemelhavam a um resfriado, os pais o levaram ao hospital imediatamente.
Na época com 6 meses de idade, o menino já havia sido diagnosticado com sintomas de asma, por isso qualquer sinal de tosse ou secreção já causava alarme na família.
Após passar pelo pronto-socorro, Francisco foi mandado para casa com o diagnóstico de alergia e algumas medicações. Mas apenas 48 horas depois, seu quadro piorou profundamente.
“Ele estava muito ofegante, com o tórax subindo e descendo. Ele estava claramente fazendo muito esforço para respirar”, diz a mãe, Camille Pasquarelli, 30.
“Ele também gemia bastante e tinha dificuldade para dormir”, relembra o pai, Daniel Ferreira, 31. “Foi aí que decidimos voltar no hospital.”
Assim que passou pela triagem, foi constatado que a saturação de oxigênio no sangue do bebê estava baixíssima e Francisco precisaria ser submetido à respiração mecânica.
“Ele ficou algumas horas no oxigênio, mas ainda não estava respirando direito. Então os médicos decidiram entubar”, conta Daniel.
Francisco ficou mais de duas semanas internado com bronquiolite. Durante esse período, passou 13 dias usando ventilação mecânica, sedado.
“Se eu pudesse deixar uma mensagem para os outros pais seria para sempre ficarem atentos aos pequenos sinais”, diz Camille.
“Foi muito importante termos prestado atenção nas alterações na respiração do Francisco e levado ele imediatamente para o hospital”.
“O médico disse que se tivéssemos esperado mais um dia poderia ter sido fatal.”
‘Quanto menor a criança, maior o comprometimento’
Além de Francisco, outras 18.172 crianças com até 2 anos foram internadas no Brasil em 2023 com VSR (vírus sincicial respiratório) até final de outubro, segundo o Boletim InfoGripe da Fiocruz. No mesmo período foram registrados 222 óbitos.
O VSR está associado a até 75% dos casos de bronquiolite, inflamação que dificulta a chegada do oxigênio aos pulmões, e a até 40% dos registros de pneumonia em crianças menores de 2 anos, segundo a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP).
“A bronquiolite é uma situação clínica que se caracteriza por uma inflamação que leva ao estreitamento da luz dos bronquíolos [ramificações finas responsáveis por conduzir o ar dentro dos pulmões]”, explica Marcelo Otsuka, coordenador do Comitê de Infectologia Pediátrica da Sociedade Brasileira de Infectologia.
“E quanto menor a criança, maior o comprometimento da ventilação para poder respirar adequadamente.”
Crianças prematuras e com problemas cardíacos ou pulmonares estão no grupo de risco. Além disso, em alguns casos pode haver predisposição genética para episódios mais graves, afirma o infectologista pediátrico.
Segundo o Instituto Nacional de Saúde (NIH, na sigla em inglês) dos Estados Unidos, as infeções agudas das vias respiratórias inferiores (entre elas a bronquiolite), estão entre as cinco causas mais comuns de óbito em crianças de até 1 ano no mundo.
Mas a grande maioria dos menores que têm um quadro de bronquiolite nem chegam à emergência e, daquelas que procuram, uma pequena quantidade precisa ser internada.
Mas nos casos graves da doença, a piora no quadro pode ser bastante repentina. “O pico de maior gravidade tende a ser por volta do quinto ao sétimo dia, mas dependendo da criança e de outras condições associadas pode haver uma piora importante já nas primeiras 24 ou 48 horas”, diz Otsuka.
A principal forma de contaminação é por meio de secreções respiratórias e por contato, ou seja, crianças que passam o dia em locais fechados com outras pessoas, como creches, estão mais propensas à infecção.
O pico de casos de bronquiolite no Brasil costuma ser no inverno, justamente porque nesse período as pessoas tendem a ficar mais aglomeradas, em locais com pouca circulação de ar, facilitando a transmissão.
“Além disso, a temperatura mais baixa diminui o que chamamos de movimento ciliar do pulmão, reduzindo a limpeza que esses cílios fazem e favorecendo as infecções respiratórias”, diz Marcelo Otsuka.
Os sintomas
No caso dos bebês é comum perceber no quadro inicial da bronquiolite sinais parecidos com resfriado. Entre eles, coriza clara, tosse, obstrução nasal, febre, irritabilidade e dificuldade para se alimentar.
Nestes pacientes, por serem muito novos e não conseguirem expectorar a secreção, os sintomas podem progredir para tosses mais intensas, dificuldade para respirar e chiado no peito. Nesses casos, a orientação é procurar um médico e o mais brevemente possível.
O principal sinal que soou o alerta vermelho para os pais de Francisco foi o esforço para fazer a expansão do tórax durante a inspiração ou a expiração.
“O tórax dele ficava subindo e descendo de uma forma diferente. Quando vimos isso já ficamos preocupados”, diz Camille.
Segundo Marcelo Otsuka, esse é um sinal claro de dificuldade respiratória e não deve ser ignorado.
Outro sintoma preocupante é o que os médicos chamam de retração de fúrcula, ou seja, o afundamento da região do pescoço, logo acima do osso chamado esterno.
Camille afirma que a mudança no comportamento de Francisco também chamou a atenção da família. “Ele é sempre muito sorridente, mas estava abatido e apático”, diz.
Os pais do menino afirmam ainda que as mais de duas semanas que passaram com o filho no hospital foram extremamente desafiadoras.
Durante todo o período em que ficou entubado, Francisco foi alimentado por sonda. Camille, porém, continuou extraindo seu leite para levar ao hospital.
Não existe tratamento para a causa da bronquiolite, por isso é possível realizar apenas tratamentos sintomáticos
“Após o diagnóstico de bronquiolite, os médicos identificaram também uma infecção bacteriana e ele teve que tomar antibiótico”, diz Daniel. “Ele também teve que fazer uma transfusão de sangue porque estava anêmico.”
“Foi muito triste. Com certeza um dos momentos mais difíceis que vivemos”, afirma. “Mas tentamos não abaixar a cabeça, com esperança de que ele iria melhorar”.
Como evitar?
Em agosto, a Pfizer protocolou um pedido à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para o registro da vacina Abrysvo contra o vírus sincicial respiratório (VSR).
O imunizante, que já foi aprovado nos Estados Unidos, é voltado para gestantes, oferecendo resposta imune contra infecções causadas pelo vírus em recém-nascidos e bebês de até seis meses de idade.
Segundo a Pfizer, os estudos clínicos mostraram que a resposta imunológica gerada pela vacina foi capaz de prevenir 82% das formas graves de doenças respiratórias em crianças de até três meses, seguindo com 69% até os seis meses.
No Brasil, a farmacêutica também pediu a aprovação para a proteção de idosos a partir de 60 anos de idade.
Mas mesmo com a vacinação, os médicos afirmam que é importante reforçar algumas medidas que previnem os bebês de contraírem a doença:
- Sempre higienizar corretamente as mãos ao segurar um bebê;
- Evitar levar o bebê em locais com pouca ventilação;
- Não permanecer com o bebê em locais onde haja fumaça de tabaco;
- Evitar a exposição do bebê a pessoas com sintomas respiratórios;
- Desinfectar superfícies e objetos potencialmente contaminados.
Os pais de Francisco afirmam que redobraram os cuidados nesse sentido.
“Temos prestado mais atenção no irmãos mais velho do Francisco, o Bento. Sempre que ele chega da escola tento dar banho ou pelo menos lavar bem as mãos dele”, diz Camille.
“Provavelmente quem trouxe o vírus para dentro de casa foi o Bento, mas não queremos impedir que ele tenha contato com o irmão.”
O médico Marcelo Otsuka recomenda também manter as crianças bem nutridas e hidratadas, além de higienizar com frequência as vias áreas, realizando lavagens nasais e inalação quando necessário.
Bebês que já possuem problemas respiratórios, como asma, sinusite crônica ou alergias frequentes devem manter acompanhamento médico regular.
O texto foi publicado originalmente aqui.