‘How to Have Sex’ ensina como falar de sexo no cinema sob a perspectiva de jovens mulheres [SPOILER] – Zonatti Apps

‘How to Have Sex’ ensina como falar de sexo no cinema sob a perspectiva de jovens mulheres [SPOILER]

Estreia de Molly Manning Walker, ‘How to Have Sex’ é um retrato familiar que celebra a amizade feminina em meio aos traumas que infortunam mulheres

[Atenção: O texto abaixo contém spoilers de How to Have Sex]

How to Have Sex demonstra muito bem o limbo enfrentado pelos adolescentes ao deixarem a escola e se prepararem para o que quer que deva vir na sequência. No filme de estreia de Molly Manning Walker, Tara (Mia McKenna-Bruce), Skye (Lara Peake) e Em (Enva Lewis), três jovens britânicas que estão justamente experimentando esse período de incertezas, esbaldam-se em uma viagem à Grécia.

Uma das metas a serem cumpridas pelas garotas durante as férias envolve sexo. Tara recebe o apoio das amigas para perder a virgindade. Desde o início do filme, que demora para dar pistas sobre o que realmente se trata, a personagem não consegue disfarçar o desconforto causado pela pressa em deixar o clube dos virgens.

O grupo de amigas acaba se juntando a outros jovens, com quem elas frequentam as festas do resort. Enquanto Skye parece interessada em Paddy (Samuel Bottomley), Tara se dá bem com Badger (Shaun Thomas), e Em inicia um romance de verão com Paige (Laura Ambler). Ainda assim, inesperadamente, Tara termina a noite ao lado de Paddy.

Enva Lewis, Samuel Bottomley, Shaun Thomas, Molly Manning Walker, Mia Mckenna-Bruce, Lara Peake e Laura Ambler (Foto: Kristy Sparow/Getty Images)

Com o amanhecer, todos se dão conta de que Tara desapareceu. Nesse momento, qualquer espectadora pensa o pior. Para dar propulsão à hipótese terrível, o longa-metragem leva a narrativa para a noite anterior, remetendo ao trauma causado por Irreversível (2002), por exemplo, do duvidoso Gaspar Noé — nem O Bebê de Rosemary (1968) escapa da temática.

A madrugada de Tara

Tara garantiu sua transa. Se muitas mulheres ainda se perguntam se é possível atingir o orgasmo durante a relação sexual com um homem, não é de se espantar que muitas se identifiquem com a cena grotesca, e felizmente rápida, que mostra a personagem perdendo a virgindade. 

Completamente ignorada pelo rapaz que, antes do sexo, fazia ela se sentir a garota mais interessante do mundo, Tara decide levar sua decepção para bem longe de Paddy após aquele momento tão íntimo. O ar continua cheirando a perigo, até que ela encontra um grupo com o qual parece se divertir genuinamente. 

Quando o sol está de volta, a personagem acompanha os novos amigos até o quarto onde estão hospedados, mas decide encarar a luz do dia e dormir à beira da piscina. Aquele clima hostil é devolvido a quem assiste, pois a vulnerabilidade à qual ela se expõe, sem saber, incomoda. 

Até então, Manning Walker entrega suspense e agonia, mas, enfim, conforta o público quando Tara retorna para Skye e Em. Com certa inveja e atitude de superioridade, Skye não cria caso com a situação e atribui a ausência da amiga ao descobrimento do sexo. Em, por outro lado, vê algo de errado no comportamento de Tara e lhe dá espaço.

Próximo de Paddy, Badger ganha confiança de Tara e percebe os abusos do amigo, mas não se mete. Na própria cama do quarto, a pouquíssimos metros de todos, ela acorda de um cochilo sendo estuprada. É inevitável não associar a situação com trecho problemático da faixa “Campo de Morangos”, de Luísa Sonza: “Acordei, tu tava me chamando / Eu tava de ladinho e tu ia colocando”. Talvez, assim, quem não entendeu consiga entender.

Despedida

Tara parece um balão esticado ao máximo, que continua sendo preenchido por angústia, prestes a ser estourado. Em e Skye, prontas para ingressar na universidade, deixam a Grécia muito unidas, ao passo em que a personagem de McKenna-Bruce termina as férias como vítima de um crime e com as mesmas incertezas do início do longa-metragem. 

Observadora, Em consegue arrancar de Tara a história do trauma. Ela se culpa por não perceber tudo antes, e Tara se culpa por não ter sido mais transparente. A essa altura, percebe-se como a diretora não tenta impedir que o público coloque a culpa na vítima. É absurdo, a maioria sabe. Mas, olhando de fora, ainda pensamos em como faríamos diferente e tornaríamos uma das situações mais amedrontadoras que existe para mulheres em uma impossibilidade.

Molly oferece um desfecho simples para How to Have Sex, que mostra Tara capaz de se perdoar pela culpa que atribuiu a si mesma por um estupro. Ainda assim, o filme é poderoso — muitíssimo graças à atuação de MiaMcKenna-Bruce, que lida bem com a câmera tão próxima de suas emoções —, porque é verossímil, comovente e familiar.

Agora, finalmente citando uma composição que merece ser ouvida: os créditos sobem ao som de “Strong”, parceria entre Romy, do The xx, e Fred again…, que foi incluída no álbum mais recente da artista, Mid Air. “Você tem sido tão forte por tanto tempo / Você aprendeu a carregar isso sozinha / Deixe-me ser alguém / Em quem pode se apoiar”, diz um trecho. “Você não precisa ser tão forte.”

Onde assistir

Um lançamento MUBI, em parceria com a O2 Play, How to Have Sex está em exibição nos cinemas desde 15 de novembro. 

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