‘Folhas de Outono’, de Aki Kaurismäki, chegou aos cinemas nesta quinta-feira, 30, e é um lançamento da parceria entre MUBI e O2 Play
Ansa (Alma Pöysti) e Holappa (Jussi Vatanen) vivem a mesma rotina: os dois não encontram prazer nas obrigações estabelecidas pelo capitalismo. Apesar de aparentemente solitários, eles têm amigos com quem podem esticar a noite em um karaokê. É diante de um palco — que lembra as apresentações no bar de Twin Peaks — que os personagens se conhecem.
Eles se encaram de maneira contida e parecem dividir o mesmo sentimento sobre o mundo — sabem de algo que ninguém mais sabe, nem mesmo o espectador. Por isso, mesmo quase inexpressivos, Ansa e Holappa conseguem deixar claro mutualmente que um romance está tendo lugar. É quase inconcebível, por exemplo, que o casal em formação possa ter se divertido tanto quanto dizem assistindo a Os Mortos Não Morrem (2019).
O diretor do longa-metragem estrelado por Adam Driver,Tilda Swinton e Bill Murray — Jim Jarmusch — é influência para o finlandês Aki Kaurismäki, que dirige Folhas de Outono. O filme, lançamento da parceria entre MUBI e O2 Play, chegou aos cinemas nesta quinta-feira, 30 de novembro.
Assim como em La La Land (2016), a narrativa de Folhas de Outono não faz questão de marcadores de tempo visuais tão óbvios. Aliás, é possível dizer que a cronologia é menos importante que as cores vibrantes (e que transmitem conforto no frio) da obra mais recente de Kaurismäki. Quando está sozinha em casa, Ansa escuta músicas e notícias em um rádio. É assim que descobrimos os avanços da guerra entre Rússia e Ucrânia, iniciada em 2022.
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A Finlândia, onde o filme se passa, faz divisa com a Rússia e, por isso, a guerra no Leste Europeu tem outro peso para Ansa. O ambiente em que vive, desde a casa até as ruas de Helsinque, é estéril. Isso fica ainda mais claro quando ela perde o emprego no mercado porque estava levando a comida que deveria ser descartada, fora do prazo de validade, na bolsa. A denúncia vem de um segurança carrasco que, provavelmente, tem mais poder que ela na hierarquia daquele mercado qualquer, mas não faz parte de uma camada social diferente.
Holappa também perde o emprego na construção, mas o motivo é a bebida. Como um bêbado, ele não tem chances com Ansa, que coleciona traumas relacionados ao vício. “Ansa” significa “armadilha” em finlandês, enquanto Holappa é também sobrenome de Pentti, famoso poeta da Finlândia. Não há nada, no entanto, declaradamente por trás desses signos. O destino do casal e a chegada do cachorro que aparece nos pôsteres do filme são descobertas que ficam para quem visitará o cinema.
No fim, trata-se de uma comédia romântica nos termos de Kaurismäki. Desse modo, portanto, vale a pena experimentar o trabalho do cineasta para conhecer o protesto e os sentimentos no silêncio de personagens tão únicos e, ao mesmo tempo, familiares.