Baseado em uma história real, longa dirigido por Marcus Baldini (Bruna Surfistinha) chega aos cinemas em 7 de dezembro; leia a crítica
Com uma arma na bolsa e o coração cheio de ressentimento, o maranhense Raimundo Nonato Alves da Conceição entrou no voo 375 da Vasp, em 29 de setembro de 1988, que tinha o Rio de Janeiro como destino. Cerca de vinte minutos após decolar, o jovem de 28 anos, que trabalhava como tratorista e tinha uma filha de poucos anos de idade, mudou a rota da aeronave: o destino agora era o Palácio do Planalto, em Brasília, e o avião deveria pousar sobre a cabeça de José Sarney, então presidente do Brasil.
O enredo de O Sequestro do Voo 375, que foi produzido por Joana Henning, do Estúdio Escarlate, e exibido pela primeira vez no Festival do Rio, realizado entre os dias 5 e 15 de outubro no Rio de Janeiro, parece ficção, mas não é. Bem menos lembrado do que o 11 de setembro, nos Estados Unidos, o episódio ficou marcado na história da aviação brasileira e agora foi recuperado através do trabalho de mais de uma década do pesquisador Constâncio Viana em um filme de fazer inveja a grandes produções hollywoodianas, que chega aos cinemas a partir desta quinta-feira, dia 7 de dezembro.
A novidade retrata os momentos antes, durante e depois do sequestro da aeronave, mas o foco fica mesmo no acontecimento. Jorge Paz, de Marighella (2019), é quem dá vida a Nonato, enquanto Danilo Grangheia, da série Irmandade (2019-), interpreta comandate Murilo, que precisa arrumar um jeito de salvar todas as vidas a bordo de uma situação inesperada, que ele jamais poderia imaginar viver ao, finalmente, retornar ao trabalho depois de um período de dificuldade.
Completando a trinca de personagens principais está a controladora de tráfego aéreo Luzia, na pele de Roberta Gualda (O Rei da TV), que acaba responsável por negociar com Nonato para que ele mude de ideia e desista do atentado. Apesar de ser um filme de ação – com cenas de fazer o espectador ficar na ponta da cadeira e perder o fôlego -, o envolvimento entre esses três personagens, muito bem costurado pelo roteiro de Lusa Silvestre e Mikael de Albuquerque, transforma O Sequestro do Voo 375 em uma produção muito mais profunda e, especialmente, humana.
Em diversos momentos de interação entre os três, o público se dá conta da complexidade de toda a situação. O caso de Nonato, por exemplo: se tivesse escolha, provavelmente não faria o que fez. Mas ele é um pai de família desesperado, sem poder ajudar a sua mãe e a sua filha, que estão passando fome, e sem perspectiva alguma de melhora, o que o leva a um ato suicida, com a intenção de resolver o seu problema ou, ao menos, confortar o seu coração.
Murilo e Luzia reconhecem isso e, de certa forma, se solidarizam com o sequestrador, embora estejam tentando, ao mesmo tempo, controlar o desespero de Nonato para que todos saiam vivos daquela situação dramática. Porém, ao final do filme, mesmo que as ações do personagem não sejam escusáveis, fica difícil cravar quem era realmente o vilão da história, em um contexto geral, o que rende assunto para belas discussões.
Tanto narrativa quanto visualmente, O Sequestro do Voo 375 é um espetáculo. Alguns espectadores mais perfeccionistas podem se incomodar com os efeitos especiais empregados na obra, mas considero algo tão pequeno em comparação à importância que esse filme tem ao chegar às salas de cinema de todo o país.
Não é todos os dias que vemos uma produção com esse nível de qualidade, tão bem amarrada em diversos aspectos, deixar os estúdios brasileiros. Portanto, acredito que o momento seja de se orgulhar e torcer para que, futuramente, o audiovisual brasileiro seja visto com mais carinho, consiga mais investimento e, quem sabe, em algum tempo não tão distante, passe substituir Hollywood como padrão de qualidade. A vontade, como podemos ver agora, existe.