Os estigmas da obesidade interferem na busca pela cirurgia bariátrica e levam parte das pessoas a adiar o tratamento da doença, indica um levantamento realizado nos Estados Unidos.
O estudo, realizado pelo Instituto Ipsos com 1.017 adultos, indica que 79% dos americanos veem a cirurgia bariátrica como um “último recurso”, e para 60% o procedimento é um atalho para perder peso.
“A cirurgia bariátrica de forma alguma é um caminho fácil”, lembra o cirurgião André Teixeira, diretor médico do Instituto de Cirurgia Bariátrica da Orlando Health, rede de hospitais que financiou a pesquisa.
As entrevistas revelaram ainda que para 61% dos americanos a prática de exercício físico e a adoção de dieta deveriam ser suficientes, uma distorção que também encontra adeptos no Brasil.
“Grande parte das pessoas percebe a obesidade como uma questão de mudança de estilo de vida, de comer menos e fazer mais exercício, e não como uma doença”, afirma o endocrinologista Fábio Rogério Trujilho, vice-presidente da Abeso (Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica).
“Muitas vezes, você precisa usar um medicamento e, quando falamos em cirurgia bariátrica, o sentimento é esse mesmo, de que é a última opção”, acrescenta. “Às vezes, o paciente se sente um fracassado por não ter conseguido bons resultados com outras metodologias.”
Para Trujilho, mesmos profissionais da saúde não especializados em obesidade podem ter essa visão, o que contribui para aumentar o tempo de espera até o tratamento adequado.
Presidente da SBCBM (Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica), Antônio Valezi acredita que a mídia e as sociedades médicas têm ajudado o brasileiro a entender que a obesidade é uma enfermidade e a cirurgia bariátrica, uma ferramenta do tratamento.
Ainda assim, é necessário enfatizar as limitações do procedimento cirúrgico e a importância de realizar acompanhamento multiprofissional, exercícios físicos e ter uma alimentação adequada depois da cirurgia.
“Tal qual um hipertenso continua com o seu cardiologista e o diabético, com o seu endocrinologista”, exemplifica Valezi. “A obesidade é uma doença crônica, que precisa de tratamento a longo prazo e dispõe de diversas modalidades terapêuticas.”
No caso da cirurgia, a resolução nº 2.131/2015 do CFM (Conselho Federal de Medicina) estipula algumas indicações, incluindo pacientes com IMC (índice de massa corpórea) acima de 40 kg/m2 e pacientes com IMC maior do que 35kg/m2 que tenham comorbidades agravadas pela obesidade, como diabetes, apneia do sono, hipertensão, doenças cardiovasculares e depressão.
O conselho também estabelece critérios para a cirurgia metabólica, em que as técnicas empregadas são as mesmas da cirurgia bariátrica, mas a finalidade é tratar doenças como diabetes.
De acordo com a resolução nº 2.172/2017 do CFM, são elegíveis para o procedimento pessoas com diabetes tipo 2, com IMC entre 30 kg/m2 e 34,9 kg/m2, sem resposta ao tratamento clínico convencional.
Além das indicações, os especialistas observam a necessidade de individualizar os casos, já que dois pacientes com o mesmo IMC podem ser impactados de forma diferente pela obesidade.
“Existem pacientes para os quais é possível o tratamento clínico e outros para os quais o cardiologista, o endocrinologista ou o ortopedista veem que não adianta insistir em métodos diferentes do tratamento cirúrgico”, afirma Valezi.
Em relação à abordagem clínica, Trujilho enfatiza a diferença entre “remédios para emagrecer” e tratamento contra a obesidade. Enquanto aqueles são com frequência utilizados sem prescrição e orientação, este deve ser acompanhado de perto por uma equipe multiprofissional. Cabe aos profissionais verificar se o paciente tem contraindicação ao medicamento e qual a dosagem adequada.
“Estamos vivendo um momento de chegada de novos medicamentos para a obesidade, mas não acho que eles vão ocupar o espaço da cirurgia. Haverá paciente para as duas ferramentas.”