A confirmação de um caso importado de sarampo no Rio Grande do Sul não será o maior desafio da equipe que tentará devolver ao Brasil o status de país livre da doença. A baixa taxa de vacinação, principalmente na dose de reforço, e o cenário internacional devem ser as principais travas no pedido que será apresentado à Comissão Regional de Monitoramento e Verificação da Eliminação do Sarampo, da Rubéola e da Síndrome da Rubéola Congênita nas Américas.
O novo caso foi confirmado pelo Centro Estadual de Vigilância em Saúde no último dia 25. Segundo o governo gaúcho, o paciente é um menino de 3 anos que chegou ao país em 26 de dezembro, procedente do Paquistão, sem ter sido vacinado.
O garoto desembarcou em São Paulo e, no dia 27 de dezembro, chegou à cidade de Rio Grande, onde no início de janeiro foi atendido com dor abdominal e febre. O Cevs afirma que a criança não estava no período de transmissibilidade durante o deslocamento e que está tomando todas as medidas necessárias, incluindo bloqueio vacinal em familiares e vizinhos e monitoramento de atendimentos por sintomas semelhantes aos do sarampo.
O caso foi o primeiro no país desde 2022, quando foram confirmadas 41 ocorrências: 30 no Amapá, um no Pará, dois no Rio de Janeiro e oito em São Paulo. A última morte registrada pela doença ocorreu em 2021, no Amapá.
O intervalo sem notificações permitiu que, no fim de 2023, o Brasil fosse classificado pela comissão como “pendente de verificação para sarampo”, um indicativo da interrupção da transmissão endêmica do vírus que causa a doença.
Para dar o passo seguinte e chegar ao status de eliminação do sarampo, o país precisa apresentar novos –e positivos– dados sobre vigilância e vacinação.
Em termos de monitoramento de casos, a avaliação é positiva. O próprio trabalho realizado no Rio Grande do Sul é um indicativo de que o país está atento a novos registros, segundo o presidente da Câmara Técnica do Brasil junto à comissão, Renato Kfouri.
A vacinação, porém, ainda está longe da meta de 95% de cobertura. Em 2022, último ano com dados completos, a taxa de cobertura da primeira dose de tríplice viral (vacina que protege contra sarampo, caxumba e rubéola) foi de 80,7% e, da segunda, de 57,64%.
A diferença de adesão entre as aplicações é conhecida como taxa de abandono de vacinas de múltiplas doses, explica Kfouri. Os pais acham que a criança está protegida com uma dose e não buscam a segunda –ou esquecem. “É um fenômeno mundial”, observa.
O desafio em relação à doença também ultrapassa as fronteiras. Na Europa, foram 30 mil casos entre janeiro e outubro de 2023, contra 941 reportados ao longo de todo o ano de 2022, de acordo com a OMS (Organização Mundial da Saúde).
“Com a explosão de casos de sarampo no mundo, só estaremos tranquilos quando o mundo estiver”, avalia Kfouri. “Nosso dever de casa é não deixar que os vírus encontrem uma zona de circulação com pessoas suscetíveis.”
O país já fez isso antes. Em 2016, a OMS concedeu ao Brasil o certificado de eliminação da doença –perdido três anos depois. Na época, as taxas de cobertura da tríplice viral eram de 95,41% (D1) e 76,71% (D2).
“Precisamos melhorar esse gap, muito prejudicado nos últimos anos, como ocorreu com as demais vacinas”, diz Kfouri.
Os dados solicitados pela comissão serão enviados nos próximos meses e a próxima reunião de avaliação deve ocorrer no meio do ano.