Mas um conceito não é um significado e um significado está longe de ser uma categoria, classe ou “caixinha”. Detestamos ser “categorizados”, porque isso significa ser integrado a um discurso, ter seu valor definido e sua mensagem pré-definida, geralmente por “categorias” que definem identidades. Por outro lado, adoramos encaixar, agrupar e definir pessoas, que não são como nós.
Este processo há muito conhecido pela psicologia social ganha um novo impulso quando o tagueamento adquire valor de mercado. Um algoritmo, por exemplo, capta e organiza palavras como significantes, não como conceitos, nem como significados. Ele cria um discurso organizado por tagueamentos associativos, em árvore, em série ou em nuvem de ocorrência.
Meu primeiro editor francês rejeitou meu livro, conhecido no Brasil por ter introduzido a ideia de lógica do condomínio, porque seu termo-chave não tinha um bom equivalente em francês. Não é que não existam condomínios na França, como existem hoje em qualquer outra parte do mundo, mas no Brasil ele se refere a um conceito diferente, pois traduz nossas gramáticas específicas de segregação, racismo, classe. O discurso da segurança e da política linguística nem sempre é o mesmo.
Quando me encontrei com os manifestantes que ocupavam a Universidade de Manchester, na luta pela causa Palestina, trouxe um retrato da recepção brasileira do problema e discuti um exemplo, ao qual sempre volto, sobre uma iniciativa da qual participei na Cisjordânia ocupada, perto de Ramallah, onde palestinos e israelenses voltavam a trocar palavras entre si, depois de 40 anos de hostilidades silenciosas, desconfiança e indiferença.
Discutimos o sentido de reparação e de resistência neste contexto, bem como o uso da psicologia e da psicoterapia para adaptar pessoas, resigná-las diante do conflito e reduzir artificialmente a demanda de transformação social, neste caos representado pela urgente necessidade de reconhecer o estado Palestino e conferir cidadania e condições de vida plena a todos os seus habitantes.
Compreensivamente reticentes, eles testemunharam graves violações no interior das práticas de acolhimento e suporte psicológico, tanto por parte de organismos internacionais quanto das psicologias israelenses a serviço do exército. Percebi então que termos como “diálogo”, “paz”, “genocídio” e “cessar-fogo” haviam sido fortemente tagueados. “Psicanálise” também fazia parte deste repertório de palavras usadas pelo inimigo. “Reconhecimento” só podia ser empregado em um sentido cuja iniciativa caberia ao outro.