Uma pesquisa divulgada neste mês identificou que o estresse crônico pode estar associado à piora do câncer colorretal por causar um desbalanço na flora intestinal humana. O efeito é causado, possivelmente, porque o estresse crônico impacta a atividade das bactérias do gênero Lactobacillus, enfraquecendo o mecanismo de imunidade antitumoral de uma célula de defesa do organismo regulada por essa bactéria.
O estresse crônico ocorre quando alguém passa por episódios estressantes, mas por um longo período. Qing Li, pesquisadora principal do estudo que foi apresentado em um evento da UEG (United European Gastroenterology), explica que o estresse crônico tem relação com a performance anormal do sistema nervoso simpático (SNS), que é ativado em situações de perigo e de emergência, e do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal (HPA), relacionado com cenários estressantes.
O funcionamento inadequado desses sistemas relacionados ao estresse crônico leva a distúrbios e consequências. Uma delas é a piora em quadros de saúde, como no caso do câncer colorretal. “Estudos epidemiológicos descobriram que pacientes com câncer colorretal e com estresse crônico têm um risco 38% maior de mortalidade em comparação com aqueles sem estresse crônico”, afirma Li.
O estudo de Li tentou trazer mais informações sobre como o estresse crônico age quando se trata do câncer colorretal. A pesquisa partiu da estimulação deste tipo de estresse em camundongos. Esse estímulo ocorreu por colocar os animais em tubos que restringiam seus movimentos durante seis horas por dia. Então, testes foram realizados para averiguar se os camundongos apresentavam o quadro de estresse crônico, o que ocorreu.
Por meio de análises, a cientista observou que a microbiota intestinal dos camundongos sob estresse crônico havia passado por alterações. Depois disso, fezes desses camundongos foram transplantadas para outros animais sem estresse crônico e, consequentemente, com uma microbiota normalizada. Por meio desse transplante, seria possível observar se o material advindo dos camundongos estressados levava à progressão de câncer colorretal —e a suspeita foi confirmada.
Li também realizou outro teste para averiguar se o estresse crônico poderia levar à piora de quadros do tumor sem apresentar impacto prévio na saúde intestinal. Nesse caso, um coquetel de antibióticos foi utilizado para matar as bactérias intestinais de camundongos e, então, parte desses animais foi submetida ao estímulo de estresse crônico e outra não.
“Observamos que, após a eliminação das bactérias intestinais, o grupo de estresse crônico não promoveu significativamente a progressão do câncer colorretal em comparação com o grupo de controle. Isso sugere que o processo pelo qual o estresse crônico promove o câncer colorretal requer mediação pelas bactérias intestinais”, explica Li.
As conclusões iniciais do estudo levantam a dúvida: por que a alteração na microbiota intestinal por meio do estresse crônico pode levar a quadros mais graves desse tipo de tumor? A explicação mais provável envolve o gênero de bactérias Lactobacillus.
Estudos prévios já atestaram que esse gênero de bactérias impacta num melhor desempenho das células T CD8+. Parte do sistema imune, essas células impactam na resposta imunológica antitumoral do organismo humano. Sendo assim, se o desempenho dessas células é impactado negativamente, como no caso da aniquilação dos Lactobacillus, isso pode agravar um quadro de câncer.
Por enquanto, investigar mais a fundo a relação entre essas bactérias e as células T CD8+ está no horizonte de pesquisa que Li deseja realizar. “No futuro, planejamos explorar o mecanismo pelo qual o Lactobacillus aumenta a função das células T CD8+. Além disso, pretendemos coletar amostras de pacientes para investigar se as mesmas mudanças ocorrem no nível humano”, diz.