Uma hora antes da final da Copa do Mundo do Qatar, o calçadão de Lusail, nos arredores do estádio, era como qualquer outro dia às vésperas de jogos importantes do Mundial. Movimentado, mas não lotado. Cerca de sete horas depois, porém, o cenário era outro. Uma multidão se concentrava no boulevard de 1,3 km enquanto esperava a campeã Argentina.
Não havia divisão entre jovens, adultos e crianças. Nem entre nacionalidade. Argentinos pareciam minoria. Sauditas, bengalis, indianos e nepaleses marcavam forte presença.
Todos se amontoavam enquanto tentavam chegar o mais perto possível do local onde passava a seleção que havia acabado de abocanhar o tricampeonato. Até Maradona, onipresente em toda manifestação que envolve a Argentina, desta vez estava mais tímido. Deus era Lionel Messi.
O camisa 10 e o restante da seleção fizeram uma rápida passagem pelo boulevard, na parte superior de um caminhão semelhante a um carro de som. Os atletas acenavam para o grupo que os cercavam nas ruas.
O veículo ia em velocidade mais alta que o comum para esse tipo de desfile. Quem estava parado para ver os jogadores mal tinha tempo suficiente para identificar quem era quem, nem dispunha de espaço suficiente para correr atrás.
Horas antes de o time chegar, os fãs já se amontoavam na beirada do centro do calçadão à espera da taça, da equipe e de Messi.
Bandeiras da Argentina enfeitavam o ambiente, mas não tomavam conta do espaço como se estivessem em uma arquibancada da torcida argentina. A maioria era de curiosos, que vestiam, no máximo, cachecóis comprados de camelôs nas cercanias do estádio.
Se arriscavam, porém, a subir em estruturas como faróis, lixos e luzes, tudo para garantir uma visão melhor dos craques que estavam passando por ali. Os celulares, sempre a postos, tentavam capturar os melhores registros dos jogadores.
O saudita Saleh Abdullah, 23, estava no boulevard para ver a Argentina passar. A Arábia Saudita e o time sul-americano se enfrentaram na estreia do Mundial. Foi a única derrota dos tricampeões.
“Hoje é o melhor dia da minha vida”, diz o saudita, que torceu para os argentinos mesmo no duelo contra a Arábia —para raiva de seus pais, que o ajudaram a pagar a viagem até o Qatar.
Entre os torcedores argentinos, o tom que embalava a comemoração era de quem, depois de um jogo apertado e um jejum de 36 anos pelo título, conseguiu respirar.
Messi abriu o placar e Di Maria deu vantagem por 2 a 0 em cima da França. Tudo parecia tranquilo, mas Mbappé empatou. Na prorrogação, Messi tornou a dar vantagem aos argentinos, e o francês, seu companheiro no time Paris Saint Germain, de novo estragou sua festa. Empate outra vez.
A histórica final terminou nos pênaltis, com os craques finalizando com assertividade, mas o time alviceleste em vantagem. Messi e Argentina são coroados campeões.
Mesmo com a celebração finalizada, os torcedores se recusavam a ir embora da arena. Enquanto houvesse qualquer sinal de jogadores argentinos em campo, fosse comemorando com seus comparsas ou com familiares, os fãs ficariam por perto.
Com grande parte do estádio praticamente vazio, torcedores vestidos de azul e branco ainda ocupavam arquibancadas. Desciam aos poucos para ir embora, muitos rumo ao boulevard com o intuito de ver de perto o time campeão desfilar com a taça pela primeira vez.
Para Santiago Bruneti, 29, assistir a Argentina de Messi ser campeã foi indescritível. Não vê o camisa 10 como um substituto natural de Maradona, embora muitos coloquem o ídolo histórico do país à sombra do camisa 10 —ao menos até agora.
Para Bruneti, Messi tem sua própria história. “Ele é uma boa pessoa, ele é um bom jogador, ele é humilde”, afirma.
Poucos foram os segundos em que o argentino conseguiu ver o time passar pelo calçadão, que logo foi tomado por músicas e fogos de artifícios.
“Messi, Messi”, em vários sotaques, gritava o público.
Era o desfecho feliz da história de amor entre a torcida argentina e o Qatar.