Quando estava na adolescência, Rokhaya Diagne costumava se refugiar no quarto do irmão, onde jogava videogames online por horas, dia após dia, até que sua mãe finalmente se cansou.
“Minha mãe disse: ‘Isso é um vício'”, diz Diagne. “Ela disse que se eu não parasse, ela me mandaria para o hospital para ver um psiquiatra.”
As intervenções de sua mãe funcionaram. Por mais que a paixão de Diagne por computadores tenha, mais do que tudo, se intensificado, ela redirecionou suas energias para objetivos mais elevados do que subir de nível no Call of Duty.
Agora, seus objetivos incluem usar inteligência artificial para ajudar o mundo a erradicar a malária até 2030, um projeto no qual trabalha em sua startup de saúde.
Os videogames “me ensinaram muitas coisas”, diz Diagne, 25, uma estudante de ciência da computação senegalesa que mora em Dakar, a capital do país. “Eles me deram habilidades de resolução de problemas.”
“Não me arrependo de jogar essas coisas”, acrescenta.
Oradora rápida, vestindo jeans e hijab, Diagne faz parte de um subconjunto da enorme população jovem da África cujas vidas foram moldadas por telas e pela internet —e que estão conectados ao mundo em um grau que nenhuma geração anterior poderia imaginar.
Para os jovens africanos interessados em carreiras relacionadas a tecnologia, a internet ofereceu um poderoso complemento a um sistema educacional que alguns especialistas temem estar prejudicando a capacidade da África de aproveitar seus jovens. Embora estejam formando mais estudantes do que nunca, as escolas ainda dependem muito de palestras expositivas.
A abundância de boot camps de codificação online gratuitos, aulas de robótica e palestras de universidades como Stanford, Oxford e Massachusetts Institute of Technology estão tendo um grande impacto em toda a África, inspirando carreiras em engenharia e gerando ideias para startups.
Enquanto alguns de seus colegas são mais apaixonados por fusão de sensores ou robótica, Diagne está interessada em IA e aprendizado profundo de máquina. Ela ajudou a criar um aplicativo de rede premiado para conhecer outras pessoas com interesses semelhantes —como o Tinder, mas para nerds de tecnologia. E fundou uma startup chamada Afyasense (pegou “afya”, ou saúde, do suaíli, uma língua da África Oriental) para seus projetos de detecção de doenças usando IA.
“Ela é alguém com quem conversar é um prazer devido à qualidade das perguntas que ela faz e também das respostas que ela dá”, diz Ismaïla Seck, um líder na crescente comunidade de IA do Senegal.
Assim como muitos outros jovens no boom tecnológico da África, Diagne está no centro de fenômenos sobrepostos no continente —uma classe média educada em crescimento que está criando filhos ainda mais educados, que, a cada toque em um teclado, adotaram a ideia de que os maiores problemas do continente podem ser resolvidos.
Diagne quer usar IA para melhorar os resultados de saúde na região, uma escolha que ela fez depois de uma série de doenças na infância que a levaram a hospitais em Dakar, que lutavam para fornecer cuidados consistentes e de qualidade.
“Eu conheço os erros que infelizmente são cometidos”, diz ela.
A determinação de Diagne lhe rendeu reconhecimento. Seu projeto de malária recentemente ganhou um prêmio em uma conferência de IA em Gana e um prêmio nacional no Senegal para empreendedorismo social, além de US$ 8 mil em financiamento.
Ela diz que era reservada quando criança, mas sempre teve um enorme interesse por pesquisa, alimentado por seu pai, um professor e escritor de literatura aposentado. Quando confrontado com as perguntas da filha sobre o funcionamento do mundo ou sobre sua fé muçulmana, ele a fazia tentar encontrar a resposta por si mesma, e a recompensava com maçãs, sua fruta favorita até hoje.
Ela se matriculou na École Supérieure Polytechnique de Dakar como estudante de biologia e conseguiu um estágio no Hospital Principal de Dakar. Mas dias revisando amostras de laboratório a ajudaram a perceber que esse tipo de trabalho não era para ela.
“Eu queria desafios muito maiores do que ter medo das bactérias em meu corpo”, diz. “Queria inovação e ser capaz de criar e usar meu cérebro para algo em vez de resultados previsíveis que eu apenas seguia.”
Desanimada por ter feito a escolha errada, Diagne abandonou a faculdade e passou um ano planejando seus próximos passos.
Ela se lembrou de algo que seu irmão costumava dizer: Faça coisas mais difíceis porque há menos concorrência. Escolheu bioinformática, a ciência do armazenamento de dados biológicos complexos e de sua análise para encontrar novas perspectivas. As opções para estudá-la no Senegal eram extremamente limitadas.
Mas a Universidade Americana de Ciência e Tecnologia de Dakar havia sido inaugurada e oferecia um curso de ciência da computação, uma área que ela decidiu que ofereceria uma base sólida para estudos futuros em bioinformática.
A abordagem da universidade enfatiza a aprendizagem aplicada, o que significa que os instrutores atribuem projetos aos alunos e esperam que eles os concluam em grande parte por conta própria. E as tarefas sempre visam resolver um problema local.
Um projeto encarregou os estudantes de construir um drone capaz de transportar uma carga de 100 quilos a uma distância de 10 km, um ato que poderia ajudar a aliviar a congestão poluente de caminhões fora do porto de Dakar. Alguns dos projetos conjuntos da universidade já renderam startups promissoras, como a Solarbox, que começou como uma tarefa de construir uma motocicleta elétrica movida a energia solar.
Diagne, que agora é uma estudante do último ano, foi designada para enviar um drone subaquático para coletar informações sobre peixes, bem como sobre as ervas marinhas, que absorvem carbono.
“Quando comecei, nem sabia o que era erva marinha”, diz ela. “Eu só tinha visto um drone subaquático em filmes. Nem sabia a diferença entre os tipos de peixes.”
Ela se dedicou ao projeto, até mesmo contratando um pescador que viu na praia para ensiná-la a pescar, para que pudesse aprender mais sobre várias espécies com alguém que sabia por experiência própria. Sua equipe está avançando para a próxima fase: construir seu próprio drone subaquático.
Enquanto procurava por outro projeto, ela descobriu que os funcionários de saúde global estavam trabalhando para erradicar a malária antes do final da década. Um dos maiores problemas de saúde do Senegal é a falta de testes rápidos e confiáveis de malária em áreas rurais. Então ela se propôs a projetar um sistema melhor de identificação de casos positivos.
Diagne lembrou-se do tédio que sentia no laboratório do hospital, examinando amostra após amostra. Esse ato mecânico parecia feito sob medida para a inteligência artificial enfrentar.
Sua universidade a ajudou a encontrar um operador de laboratório que lhe forneceu um conjunto de dados de células que ela alimentou em uma ferramenta de aprendizado profundo, treinando-a para identificar casos positivos. Os usuários conectarão microscópios a um laptop carregado com seu programa de IA —incluindo microscópios impressos em 3D que são baratos e pequenos o suficiente para serem implantados em áreas rurais.
À medida que seu projeto de malária se aproxima do lançamento no mercado, Diagne já sabe o que pretende fazer em seguida: usar a IA para detectar células cancerígenas.
Diagne tem contado com os líderes de sua universidade e com a crescente comunidade tecnológica da África Ocidental, que têm se mostrado ansiosos para oferecer conselhos à medida que seus projetos ganham reconhecimento.
E ela está pronta para ajudar aqueles que estão seguindo seus passos.
“Muitas pessoas estão entrando em contato comigo, dizendo: ‘Como você fez isso? Como você fez aquilo?'”, diz ela. “Posso orientá-los e mostrar o caminho.”