Autor do PL Antiaborto por Estupro, o deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) é considerado o porta-voz do pastor Silas Malafaia na Câmara e um dos principais herdeiros políticos do ex-presidente da Casa Eduardo Cunha.
O parlamentar eleito pelo Rio de Janeiro é membro da igreja Assembleia de Deus Vitória em Cristo e um dos mais barulhentos defensores de pautas conservadoras no parlamento.
Aliado fiel de Jair Bolsonaro (PL), anda alinhado com as bandeiras do ex-presidente e exerce papel de liderança dentro da bancada evangélica.
Durante a pandemia da Covid, reverberou teses negacionistas do então chefe do Executivo e defendeu tratamentos sem comprovação científica, apesar de ter visto os medicamentos não surtirem efeito quando ele mesmo contraiu a doença.
Procurado pela Folha nesta terça-feira (18), o parlamentar não respondeu.
Diante da repercussão negativa do PL, a cúpula da Câmara, comandada pelo deputado Arthur Lira (PP-AL), decidiu criar uma “comissão representativa” para discutir o tema somente no segundo semestre deste ano.
Sóstenes está no terceiro mandato de deputado federal. De 2014 para cá, viu sua votação cair de maneira significativa —elegeu-se na primeira vez com 104 mil votos e, na última, com 65 mil—, mas manteve o assento no parlamento.
Apesar de ter perdido apoio nas urnas, seguiu com força dentro do Legislativo. Prova disso é que foi eleito no início de 2023 para o cargo de segundo vice-presidente da Mesa Diretora.
Embora o PL de autoria do deputado tenha sido criticado até por parte da direita, que considerou a condução do debate um tiro no pé, aliados de Sóstenes fazem uma avaliação positiva da controvérsia.
Isso porque a proposta colocou o deputado no centro das atenções e reforçou sua imagem de defensor radical de pautas que bolsonaristas dizem ter origem nos valores cristãos.
Sóstenes ganhou os holofotes e entrou em embate até com o presidente Lula (PT). “O cidadão diz que fez o projeto para testar o Lula. Eu não preciso de teste. Quem precisa de teste é ele. Eu quero saber se uma filha dele fosse estuprada, como ele ia se comportar”, afirmou o presidente nesta terça-feira (18).
O projeto do deputado limita o aborto a até 22 semanas de gestação. E prevê pena de 20 anos de prisão para a mulher e quem a auxiliar na interrupção da gravidez.
Com isso, a mulher que fizer o procedimento, se condenada, cumprirá pena de 6 a 20 anos de prisão. Ou seja, a ela será imposta uma pena maior do que a de seu próprio estuprador.
A pena prevista para estupro no Brasil é de 6 a 10 anos. Quando há lesão corporal, de 8 a 12 anos. Cerca de 61% das vítimas de estupro no Brasil em 2021 eram crianças e adolescentes com 13 anos ou menos.
Atualmente, o procedimento é permitido em três situações, que são gestação decorrente de estupro, risco à morte da mulher e anencefalia fetal. Nenhuma delas, porém, prevê um prazo limite da gravidez para ser realizado.
O autor do projeto deu declarações imprecisas para defender a proposta. Nas redes sociais, afirmou que fetos de bebês abortados são usados na indústria de cosmético. Não há, porém, evidências nesse sentido.
“Urgente: Descubra a verdade por trás das motivações do aborto e a relação com empresas multimilionárias que utilizam fetos em produtos farmacêuticos”, ele escreveu em publicação —somando as visualizações no X e no Instagram, foram mais de 1 milhão.
Além disso, dois médicos citados pelo parlamentar na justificativa que acompanha o PL dizem que o parlamentar apresentou uma versão fantasiosa para um caso rumoroso de aborto em uma menina capixaba estuprada em 2020.
O deputado iniciou sua trajetória na Câmara em 2015 como apoiador da candidatura de Eduardo Cunha à presidência da Casa. Após a vitória, passou a compor a tropa de choque do então chefe da Câmara.
Apesar da relação próxima, a queda de Cunha não foi ruim para ele. Sóstenes tornou-se um dos principais herdeiros políticos do ex-presidente da Câmara. Em 2018, por exemplo, vitou o nome preferencial de deputados estaduais que, até então, costumavam fazer dobradinha eleitoral com Cunha.
Outro parlamentar próximo de Sóstenes é o deputado estadual Samuel Malafaia (PL-RJ), irmão do pastor Silas Malafaia.
Na eleição de 2018, o deputado federal doou R$ 471 mil para a campanha de Samuel. A relação dele com a família é de proximidade. À Folha Sóstenes já deixou clara a proximidade: “Sinto por ele um carinho de pai adotivo”, disse sobre Silas em 2022.
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