O livro “Cartas a Lucílio”, escrito pelo filósofo estoico Lucius Annaeus Seneca, é uma obra de grande importância que explora diversos aspectos da filosofia estoica, vida, morte, dever e moralidade. Composto por 124 cartas, o livro oferece conselhos práticos e reflexões sábias sobre a natureza da vida humana e o caminho para a virtude. Sêneca aborda temas como o estoicismo, a brevidade da vida e a tranquilidade da mente, apresentando um estilo variado que vai desde a consolação filosófica até o aconselhamento moral e a análise introspectiva.
A relevância histórica desse livro é inquestionável, pois o estoicismo retratado por Sêneca nas “Cartas a Lucílio” influenciou pensadores, filósofos e teólogos ao longo dos séculos, desde os primeiros cristãos até os filósofos modernos. Além disso, a obra oferece uma visão única da vida romana e das ideias filosóficas durante o período do Império Romano, proporcionando aos leitores uma compreensão mais profunda do contexto histórico e cultural da época.
No contexto contemporâneo, o livro continua sendo relevante. Em um mundo cheio de distrações e dilemas morais, os ensinamentos de Sêneca fornecem um guia prático para enfrentar os desafios da vida com serenidade e sabedoria. As reflexões presentes nas cartas têm sido uma fonte de inspiração para milhões de leitores em todo o mundo, lembrando constantemente a importância da autodisciplina, do autocontrole e da aceitação.
A Revista Bula selecionou cinco trechos destacados das “Cartas a Lucílio”, compilando partes essenciais da sabedoria de Sêneca. Cada trecho captura uma parte importante da filosofia do autor e demonstra seu impacto duradouro na sociedade atual. Ao ler essas cartas, os leitores são convidados a embarcar em uma jornada filosófica enriquecedora e a refletir sobre questões fundamentais da vida humana. O livro “Cartas a Lucílio” se torna, assim, uma leitura indispensável para aqueles que buscam sabedoria e um maior entendimento de si mesmos e do mundo ao seu redor.
Desfrute sem orgulho o que é bom para você e o que foi concedido pela sorte; não hesite em desfrutar do que é puro e ceda ao prazer, mas evite as coisas que irão custar caro depois. Embora prazeres simples não tornem a vida mais feliz, eles a tornam mais tolerável e agradável, enchendo-a com doçura e suavidade, e nos enviam para o trabalho importante da vida com a mente mais calma. Se você gostaria de desfrutar uma verdadeira e divina alegria, é com estas coisas que você pode satisfazer seu estômago, estas e a comida que não envolve nenhuma ostentação e é fácil de obter. Vaguear pelo campo, colher as frutas que as diferentes estações produzem nas árvores, recolher as uvas com suas próprias mãos, não se privar do leite e do mel, que é a mais doce das refeições pastorais, cozinhar algo que você encontrará não em seu próprio prato, mas no prato comum, e que precisa apenas ser levado à boca para ser desfrutado.
Perguntas se podes adquirir a virtude, apesar de seres escravo? Se não puderes adquirir a virtude a menos que sejas livre, por outras palavras, se perderes a tua liberdade, perderás também a virtude. Não te peço para arranjares uma grande soma de dinheiro ou para te tornares eloquente ou sábio; todas estas coisas requerem ajuda e tempo. A natureza dá-te, no entanto, a virtude gratuitamente. A única coisa que o acaso pode negar-te é a posse de objetos exteriores; mas não é do acaso que depende a virtude. Esta reside em ti, ela é tua, não pode ser tomada nem afastada, a não ser que tu o queiras; podes ser escravo e ainda assim ser livre. Sócrates era livre, embora estivesse preso; Catão era livre, embora a República fosse escrava. Assim, a pergunta que fizeste é de grande interesse, pois é universal, mas a resposta é clara e evidente: a virtude é livre e pode ser adquirida por todos, não é concedida aos ricos mais do que aos pobres, não é mais fácil para os poderosos do que para os fracos adquiri-la. “Mas como posso adquiri-la?” perguntais. Em ti mesmo e em mais lugar nenhum.
Ocorre-me agora uma ideia bastante digna de ser explorada e cultivada, a de que a felicidade depende de que o nosso espírito seja levado pela razão, que nem nos abandonará, a menos que primeiro abandonemos a ela, nem nos será arrebatada por ninguém, salvo por nós próprios. Se a base e as raízes da felicidade estão em nós, por que a procuramos fora de nós? Erramos e nos enganamos, e mais ainda, nos iludimos de diversas maneiras, pois a nossa cegueira faz-nos acreditar que as coisas que estão distantes de nós são mais desejáveis do que aquelas que temos ao nosso alcance. Acreditamos que, se pudermos atingir essas coisas, seremos felizes e tranquilos, sem perceber que o bem não se encontra em qualquer lugar fora de nós, mas dentro de nós, ou melhor, que nós mesmos somos o bem. O que há de maior, na verdade, que seres que sabem e conhecem, que lembram e preveem, que podem acompanhar ou mesmo ultrapassar o curso acelerado da natureza, que possuem tudo o que é belo, tudo o que é valioso para a vida, a quem não falta nada para a grandeza ou para a plenitude, e que estão completos em si mesmos? Se esta for a nossa condição, por que é que a natureza adicionou ainda este último encargo, o de levar uma carga pesada e inútil, quando já somos completos antes de o fazer?
Não é que tenhamos pouco tempo, mas perdemos muito. A vida é suficientemente longa e com generosidade foi-nos dada, para a realização das maiores coisas, se a empregarmos bem. Mas quando ela é desperdiçada no luxo e na indiferença, quando não se aplica a nenhum bom fim, forçados pelo último e fatal termo, percebemos que passou um tempo que não soubemos que passava.
Conserva-te livre de contaminação e acima de qualquer injúria do destino; ergue-te acima de tudo, para que nada, humano ou divino, possa interromper os teus deveres. Aquele que não fez nada mais do que que não ser impedido pelos homens, conseguiu muito. (…) Todos os homens, irmão, têm de morrer; mas nem todos realmente vivem. Atenta nisso. A tua vida é muito curta e, todavia, já fizeste o bastante para uma vida longa.