Maus tratos na infância preveem dificuldades emocionais na vida adulta | ALERT-ONLINE.COM – Zonatti Apps

Maus tratos na infância preveem dificuldades emocionais na vida adulta | ALERT-ONLINE.COM

Já quis transmitir um sentimento, mas simplesmente não conseguiu encontrar as palavras certas para o expressar? Milhões de pessoas lutam contra um traço de personalidade conhecido como alexitimia, que significa “sem palavras para os sentimentos”. Indivíduos com alexitimia têm dificuldade em identificar, descrever e expressar as suas emoções.

 

Esta característica pode prejudicar os seus relacionamentos sociais e íntimos. Provavelmente perderam pistas sociais e, portanto, não reconhecem, nem compreendem, os sentimentos dos outros. Estudos anteriores sugeriram que uma história de maus-tratos na infância poderia desempenhar um papel no desenvolvimento de alexitimia em adulto. Uma nova meta-análise liderada por investigadores do Laboratório de Psicofisiologia da Universidade de Stanford, conjuntamente com colaboradores das Universidades Hebraica e Adam Mickiewicz representa o primeiro estudo a sintetizar as ligações entre alexitimia adulta e todas as formas de maus-tratos infantis.

 

Anat Talmon, co-autora do estudo, entende que se pode afirmar com mais segurança que os fenómenos de maus tratos infantis e a alexitimia estão em grande medida relacionados entre si. Foram examinadas 78 fontes públicas que relataram detalhes de possíveis maus-tratos infantis e níveis de alexitimia na idade adulta. No total foram incluídos neste estudo 36.141 participantes.

 

Em todo o mundo uma em cada quatro crianças é maltratada, mas muitas vezes não é reconhecida. Foram considerados 3 tipos de maus-tratos infantis: negligência emocional, abuso emocional e negligência física – considerados preditores particularmente fortes de alexitimia. A negligência emocional e a negligência física geralmente ocorrem juntas; os dois outros tipos – abuso sexual e abuso físico – foram também relacionados à alexitimia, mas foram menos preditivos.

 

A negligência emocional ocorre quando os cuidadores falham em atender às necessidades emocionais de uma criança, incluindo segurança e conforto. O abuso emocional acontece quando os cuidadores ridicularizam, menosprezam ou culpam as crianças, tornando-as responsáveis pelos problemas domésticos ou dos cuidadores. A negligência física envolve cuidadores que não fornecem alimentação adequada, roupas ou um ambiente seguro.

 

Quando alguém é abusado sexual ou fisicamente, muitas vezes sabe, até certo ponto, que algo está errado. Negligência emocional e abuso emocional, no entanto, são muitas vezes mais difíceis de identificar pela vítima ou por outros membros da família ou vizinhos. As vítimas podem ser menos propensas a procurar ajuda. Negligência emocional e abuso emocional são experiências extremamente devastadoras para uma criança – ninguém está a satisfazer as suas necessidades emocionais, mas a criança não tem a capacidade de identificar e reconhecer as suas emoções por conta própria, o que aumenta a probabilidade de desenvolver alexitimia.

 

Cerca de 10% da população em geral apresenta níveis clinicamente relevantes de alexitimia. Para as mulheres, é cerca de 7%. Para os homens, é quase o dobro disso, cerca de 13%. Altos níveis de alexitimia estão associados a distúrbios psicológicos, incluindo autismo, depressão e esquizofrenia. Segundo James Gross, professor de psicologia, é cada vez mais claro que tanto a alexitimia como os maus-tratos infantis são fatores de risco trans-diagnóstico, o que significa que a sua presença coloca uma pessoa em maior risco de desenvolver uma ampla gama de transtornos mentais. No entanto, o que ainda não está claro é como esses dois fatores de risco estão relacionados entre si e porque motivo é que ocorrem com frequência simultaneamente.

 

Para entender as ligações entre alexitimia e maus-tratos infantis é útil considerar o papel crucial desempenhado pelos cuidadores – eles são tipicamente o modelo mais importante para as crianças no seu desenvolvimento emocional. No entanto, os cuidadores são também os perpetradores mais comuns de maus-tratos infantis. Crianças maltratadas crescem com menos exemplos de estratégias positivas de enfrentar o stress e menos oportunidade de expressar emoções apropriadamente. Em resposta a eventos negativos, algumas crianças maltratadas podem-se comportar de forma agressiva ou violenta, enquanto outras se fecham num afeto emocional plano ou distanciamento. Pesquisas anteriores mostraram que o distanciamento dos sentimentos está fortemente relacionado com o abuso emocional ou com a indisponibilidade dos cuidadores. Essas crianças podem afirmar: “eu não me importo; estou a sobreviver”, mas de facto elas não sabem o que querem porque não sabem qual é a sua voz interior e qual a sua verdadeira vontade.

 

Entretanto algumas formas de maus-tratos podem ser subtis. Cuidadores bem-intencionados podem estar cronicamente doentes, clinicamente deprimidos ou incapazes de apoiar emocionalmente as crianças por outros motivos. A terapia de alexitimia pode ajudar. Intervenções terapêuticas aprimoradas para adultos com alexitimia são necessárias, segundo os investigadores. As pessoas em tratamento para depressão, por exemplo, podem ter uma pontuação alta em alexitimia, tornando mais difícil para elas serem introspetivas e bem-sucedidas na terapia. Os terapeutas avaliam a dificuldade dos pacientes em expressar e identificar emoções. O tratamento para adultos com alexitimia geralmente envolve ajudá-los a desenvolver a capacidade de estar em contacto com as suas emoções, entendê-las e explicá-las de maneira incorporada – antes de poder trabalhar na regulação do seu sentimento o paciente precisa primeiro de entender e reconhecer esse mesmo sentimento, segundo Anat Talmon.

 

Os familiares e amigos devem tentar entender que as pessoas com alexitimia muitas vezes não identificam e expressam os seus sentimentos tão prontamente como os outros, ou não entendem os sentimentos dos outros – eles não estão a tentar ser difíceis, eles lutam de facto com esse problema.

 

ALERT Life Sciences Computing, S.A.

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