Plataformas de vídeos curtos como o Intagram, o Facebook, o Tik Tok, o Kwai e até o próprio YouTube viraram o centro das discussões tecnológicas nas primeiras décadas deste século. Elas são fonte de memes e de uma linguagem própria, com dancinhas inocentes que logo viraram piada e hoje cultivam um ecossistema gigantesco de conteúdo.
Com adesão cada vez maior dos internautas, a tendência passou a ditar o comportamento de toda uma geração e desenvolveu um vício em looping que acaba por diminuir a capacidade de autocontrole, causando uma dependência patológica e compulsiva do aparelho celular. Isso sem falar na proliferação de conteúdo tóxico, impróprio e perigoso.
Entre os pais e profissionais de saúde de vários países, a principal preocupação é: o fluxo inesgotável das imagens dos aplicativos seria responsável por modificar o comportamento de crianças e adolescentes e destruir sua capacidade de atenção.
Segundo as teorias, assistir continuamente a gravações que duram em média 30 segundos, com o poder de sempre passar para a próxima, deixaria o público com dificuldade de ver vídeos mais longos.
Até o momento, não existem muitas pesquisas que comprovem essa possibilidade, até porque diversos outros fatores, plataformas, aplicativos e tecnologias podem causar efeitos similares. O Tik Tok, o Reels ou o Kwai poderiam ser apenas mais um degrau nessa escalada de diminuição de atenção.
A principal evidência de que a rede causa a deterioração cognitiva de toda uma geração é um estudo de 2021 feito por pesquisadores do Departamento de Psicologia da Universidade de Zhejiang, na China. Ao verificarem exames de ressonância magnética do cérebro, os cientistas concluíram que o uso do app está relacionado à ativação de áreas normalmente acionadas em atividades altamente viciantes, o que diminui a “capacidade de autocontrole entre jovens adultos”.
A pesquisa analisou 30 alunos da universidade que usam com frequência a plataforma — 46% assistiam a vídeos todos os dias. As cobaias viram sequências de imagens filtradas pelo algoritmo da rede social e também gravações sem nenhuma personalização. Nas duas situações, o cérebro dos participantes ativou regiões produtoras de dopamina, mas apenas com os vídeos indicados por algoritmo foram fortemente estimuladas sub-regiões como a área tegmental ventral (ATV) — conhecida como o início do circuito de busca e recompensa.
A pesquisa também revela a complexidade do estudo de mídias, uma vez que tais sistemas distorcem a realidade em nome da comunicação e, na era contemporânea, a alimentação dos próprios algoritmos.
É o que lembra o alemão Friedrich Kittler, um dos mais importantes teóricos de mídia do século 20, no livro Gramofone, Filme, Typewriter (1986): “Compreender as mídias permanece impossível, porque as tecnologias de comunicação dominantes controlam a distância todo entendimento e provocam suas ilusões sobre elas. […] O que permanece das pessoas é aquilo que a mídia é capaz de registrar e transmitir”.
O foco do estudo no algoritmo de recomendação da rede social, e não apenas no formato de vídeos curtos, é uma ênfase compreensível naquilo que tornou o TikTok tão popular rapidamente. A área nobre da plataforma é a chamada For You Page (FYP, para os íntimos), que reúne essas recomendações incessantes. Quanto mais a plataforma é utilizada e mais dados pessoais são coletados, mais preciso se torna o filtro.
O algoritmo da FYP é um dos maiores segredos tecnológicos da atualidade e, segundo uma publicação oficial de 2020 do blog da empresa, leva em conta fatores como “interações do usuário”, “informações do vídeo” e “configurações de dispositivo e conta”.
“Cada nova interação ajuda o sistema a aprender sobre seus interesses e sugerir conteúdo — portanto, a melhor maneira de selecionar seu feed For You é simplesmente usar e aproveitar o aplicativo”, incentiva a empresa.
O objetivo, é claro, é manter todos usando a plataforma o máximo possível, e para isso o app se aproveita da química cerebral. “As redes sociais liberam dopamina, endorfina, serotonina no cérebro, sem que a pessoa perceba. Como é rápido, o prazer é imediato”, afirma a professora Anna Lucia King, psicóloga, doutora em saúde mental, professora da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) e fundadora do Instituto Delete, em entrevista ao R7.
As redes sociais concorrentes logo tentaram clonar o For You em suas respectivas plataformas. Até mesmo veteranos como a Meta — que impiedosamente ditou o ritmo de funcionamento da internet nas últimas décadas.
A plataforma chinesa ainda transformou o funcionamento de redes sociais: saem de cena as relações entre o público e os influenciadores, e é formado um reino no qual o único mandatário é um algoritmo obscuro que alimenta feeds e páginas dia e noite, sem parar.
Em abril de 2022, funcionários do Facebook receberam um memorando interno que pedia que o feed do aplicativo da rede social se parecesse mais com o TikTok. Isso ocorreu após o Instagram ter sido parcialmente repensado para passar a focar primordialmente o formato Reels.
Segundo o portal The Verge, que teve acesso ao documento, o executivo-chefe do Facebook, Tom Alison, achava que a empresa não estava fazendo o suficiente para competir com o rival, “um legítimo desafiante ao seu domínio nas mídias sociais”, em um alarme semelhante ao momento em que criou o Stories especificamente para canibalizar com sucesso o crescimento do Snapchat.
Assim como muitos usuários, Raphael Conti, de 26 anos, começou a passar tempo nos vídeos curtos nos momentos incessantes de “tédio geral” da pandemia de Covid-19. O que começou como uma simples forma de passar o tempo se tornou quase um comportamento compulsivo.
“Comecei a usar há uns três anos, e minha experiência hoje é saber que estou num vício, mas não conseguindo parar. Diariamente uso cerca de duas horas, principalmente em momentos de parada de trabalho, idas ao banheiro e antes de dormir”, afirma Conti, engenheiro da computação que mora em São Paulo, em entrevista ao R7.
Para ele, os principais atrativos da plataforma foram sua velocidade, que torna possível consumir uma “grande quantidade de conteúdo em pouco tempo”, e a variedade dos vídeos, que atendem a diversos interesses seus a todo momento.
“A rede social é capaz de resumir muita coisa rapidamente para manter a atenção. E eu adoro essas coisas, saber um pouco de tudo. E, se me interessar, acabo indo pesquisar um pouco mais”, completa ele. Mas o uso contínuo chegou a atrapalhar sua atenção. Por vários meses o engenheiro não conseguiu ver vídeos maiores e mais detalhados de outras plataformas.
“O algoritmo piorou, acho que por incentivar a criação de conteúdos com mais de um minuto para segurar a visualização. Para mim, praticamente só aparecem cortes de podcast, que tentam deixar esses programas mais atrativos. Isso me tem feito ir para os Reels do Instagram, com vídeos que são mais comediazinnha, tem mais coisa boba”.
Estranhamente, tudo parece ter se ajustado após a reclamação, segundo o engenheiro, que enviou outra mensagem após a entrevista: “Uns dias depois que falei que o algoritmo tinha piorado, ele parece ter voltado ao normal”, disse, entre risadas.
Abusar de vídeos curtos é algo gritantemente simples. É como sentar-se diante de uma TV, o que soa quase anacrônico. Um vídeo ocupa praticamente toda a tela, com botões de interação ao lado.
Os principais comandos são de like, com um duplo clique. E há outro para passar para o próximo vídeo, o agora extremamente popular “arrasta para cima”. É possível usá-lo com uma mão sem grande dificuldade, com pouca atenção e atrito. Boa parte dos vídeos não tem contexto, legendas nem informações complementares: trata-se de conteúdo puro, rápido e impactante, como a passagem de um asteroide.
Essa simplicidade também acrescenta outras, num ecossistema em que a sociabilidade é completamente secundária. Não existe feed, não é necessário seguir ninguém, e o desejo de ser seguido não é onipresente. Uma vez dentro das redes, a chance de permanecer lá e gastar cada vez mais tempo simplesmente deslizando o dedo é gigante.
Não é algo inédito, nem mesmo recente. Em 1936, o filósofo Paul Valéry fez a seguinte previsão certeira sobre o futuro das telecomunicações: “Assim como a água, o gás e a corrente elétrica vêm de longe para nossa casa a fim de responder às nossas necessidades mediante um esforço quase nulo, assim seremos alimentados de imagens visuais e auditivas nascendo e se evanescendo ao mínimo gesto, quase a um sinal”.
Pensadores contemporâneos chegam a conclusões parecidas. “As mensagens curtas têm o poder de se espalhar rapidamente e gerar efeitos de identificação em quem as consome e em quem as compartilha. Como consequência, muitos se tornam heavy users, pessoas que desenvolvem um relacionamento de muita proximidade com determinadas mídias sociais”, esclarece Ariane Holzbach, doutora em comunicação, pesquisadora de novas tecnologias e memória social e professora da UFF (Universidade Federal Fluminense), em entrevista ao R7.
Mas praticamente todos concordam em não aplicar o termo “vício” quando levamos em conta os efeitos do uso de redes sociais e outras mídias. Nos mais diversos estudos, entende-se que mídias não podem viciar, embora alterem o comportamento de quem as usa, o que pode resultar em compulsão.
“O vício em redes sociais não existe, uma vez que essa é uma patologia. Mesmo quem usa sem impor limites de tempo não está viciado. O que acontece é uma dependência patológica chamada nomofobia [medo irracional de ficar longe do celular], geralmente ligada a um transtorno primário, como ansiedade, compulsão, síndrome do pânico ou transtorno dismórfico corporal, que potencializa o uso”, explica a professora Anna King, que acrescenta que esse distúrbio primário é que deve ser tratado, inclusive com remédios.
Para a doutora Ariane, é preciso trocar a pergunta e buscar entender os motivos por trás do uso intensivo desse tipo de mídia, para evitar um “tratamento superficial” da questão. Apontar o dedo unicamente para as redes sociais é simplesmente “mascarar o problema”.
“O problema, na verdade, está em uma estrutura muito mais complexa: por exemplo, na maneira como os países tratam os grandes conglomerados midiáticos e a relação desses conglomerados com os Estados”, completa Ariane Holzbach.
Em 2019, o cinegrafista Gabriel Fogal começou a ver vídeos curtos por necessidade do mercado de trabalho. Não demorou e ele começou a assistir a cerca de quatro horas diárias de vídeos nos aplicativos, que muitas vezes atrapalhavam seu sono. Ao R7, ele contou a experiência até conseguir largar o app.
Assim como o físico J. Robert Oppenheimer em sua época, Aza Raskin é um homem arrependido de sua própria invenção. Filho de um dos responsáveis pelo projeto Macintosh, da Apple, especialista em design e interface, o então jovem californiano inventou a rolagem infinita (infinite scroll, em inglês).
Antes da ideia, redes sociais e sites eram cheios de botões para recarregar e tentar manter o usuário engajado. Timelines e feeds eram finitos e precisavam de comandos para ir para a próxima página. A invenção de Raskin, junto com o botão giratório, hoje presente em todos os mouses e telas de toque, transformou tudo.
É possível girar a rolagem infinitamente até se cansar e sem perceber quanto tempo ou esforço foram gastos. A função é perfeita para smartphones, prontos para atender a todos os comandos das pontas dos nossos dedos. Sem a rolagem infinita, Instagram, Twitter e Facebook seriam plataformas completamente diferentes, com mais atrito e menos engajamento.
Raskin inventou a função em 2006. Na época, trabalhava em uma consultoria de interface de computadores. A internet também era diferente: existia o que foi chamado de Web 2.0, um esforço colaborativo com blogs, fóruns e wikis cheios de conteúdo feito por usuários.
Pensava-se que o futuro era a comunicação feita entre pessoas, e empresas apenas intermediariam tudo. Os algoritmos vieram e transformaram o mundo. Hoje, Raskin é um desenvolvedor profundamente pesaroso da própria criação e de como ela transformou para sempre as mídias sociais e seus usuários.
“Como designer, sei que, eliminando o sinal de parada, posso obrigar você a fazer o que quero que faça”, disse ele em uma entrevista ao jornal The Times, em 2019. “Essa história que todos nós contamos a nós mesmos, de que estávamos tornando o mundo melhor com a tecnologia, essa história foi desfeita, não posso mais contá-la a mim mesmo.”
Em uma conversa com a BBC em 2016, Raskin descreveu em mais detalhes como ele e outros criadores são levados a conceber uma interface que deliberadamente tem como objetivo viciar seus usuários.
“É como se eles estivessem pegando cocaína comportamental e espalhando-a por toda a sua interface. Se você não dá tempo ao seu cérebro para acompanhar seus impulsos, você simplesmente continua rolando.”
Raskin, hoje um defensor do uso ético da tecnologia, não está sozinho entre criadores de sucesso que se sentem culpados ao perceber as consequências das próprias invenções.
A cientista da computação Leah Pearlman foi cocriadora do botão Curtir do Facebook, um dos mais icônicos recursos da rede social. Ao sair da empresa e se tornar artista de quadrinhos, ela se viu presa na própria armadilha que ajudou a criar e percebeu que ficava mal quando não recebia muitas curtidas.
“Mesmo que eu pudesse culpar o algoritmo, algo dentro de mim estava tipo ‘eles não gostam de mim’, ‘não sou boa o suficiente'”, afirmou a artista, em entrevista à Vice. Para contornar o problema, ela comprou anúncios que aumentaram o engajamento.
Geoffrey Hinton, por sua vez, é conhecido como “padrinho da inteligência artificial”, por ter criado as bases das redes neurais artificiais e modelos de aprendizagem profunda.
De 2013 a 2023, ele trabalhou como professor da Universidade de Toronto e foi vice-presidente de engenharia do Google, responsável por pesquisa e desenvolvimento de IA. É provável que em um futuro próximo Hinton seja citado como um dos cientistas mais inovadores da primeira metade deste século. Em maio, ele anunciou sua saída da empresa e alertou para os riscos da escalada de desenvolvimento de chatbots e programas similares.
Também se disse arrependido da própria criação. “Eu me consolo com a desculpa normal: se eu não tivesse feito isso, outra pessoa o teria feito”, revelou Hinton ao New York Times, antes de declarar que a IA representa um risco ao futuro da humanidade.
Assim como a MTV em sua época — ela própria responsável por remodelar e globalizar a linguagem televisiva e a cultura popular com os onipresentes videoclipes, antes de sucumbir diante da popularização inevitável da internet —, o conteúdo do TikTok funciona em um contexto próprio. A rede carrega em seus nichos algumas tendências esquisitas e inexplicáveis, além de astros improváveis.
A mais estranha e contemporânea delas é chamada de NPC trend — NPC são personagens não jogáveis de games, que geralmente oferecem missões ou dão informações aos protagonistas. E alguns deles nem isso fazem: só se movimentam de forma repetitiva e sem objetivos no fundo da tela.
Nos vídeos da rede social, praticamente incompreensíveis para quem está de fora, pessoas (geralmente mulheres jovens) fazem movimentos esquisitos enquanto uma segunda pessoa que imita o protagonista interage com ela.
Em uma versão ainda mais estranha, a performance é feita ao vivo, dura horas, e as interações são prerrogativa do público — quase sempre, com dinheiro envolvido. Nicki Loczek, uma das mais famosas NPCs, tem quase 3 milhões de seguidores e vídeos que ultrapassam 15 milhões de visualizações.
Alguns dos desafios performativos fazem ainda menos sentido e podem ser perigosos. O Penny Challenge (desafio do centavo, em português), por exemplo, incentivava seus participantes a colocar um carregador de celular pela metade na parede e inserir uma moeda nas pontas de metal. Às vezes voavam faíscas, às vezes paredes eram incendiadas.
Em alguns casos, crimes chegam a ser incentivados. Vídeos de diferentes redes convocaram pessoas a saquear a loja JD Sports, em Londres, no dia 9 de agosto.
Centenas de voluntários compareceram, e o que se viu foi pura tensão: policiais confrontaram os ladrões com cassetetes, enquanto lojistas da movimentada rua Oxford fecharam as portas com os clientes dentro. Nove pessoas foram presas. Autoridades não informaram como o que chamaram de “especulações na internet” começaram e culminaram em uma tentativa de roubo em massa.
Em maio de 2021, a modelo Dakota Fink publicou um vídeo bobo em uma rede social, no qual sugeria que camadas de peles de mulheres saem após a menstruação. O registro mostra a jovem tirando uma máscara facial, com a legenda “Como eles não sabiam disso?”.
A publicação recebeu quase 5 milhões de curtidas e foi compartilhada 300 mil vezes. Vários usuários fizeram piadas: “Meu marido se divorciou de mim quando descobriu isso”, afirmou uma das respostas. “Eu e minha irmã chamamos isso de ‘casca mensal'”, disse outro comentário.
Como as redes sociais são estruturas gigantescas feitas para captar a atenção dos usuários e criar engajamento (leia-se: coleta de dados pessoais para vender propaganda) em seus próprios termos, o conteúdo não precisa refletir a realidade, mas sim ser extensão das regras da plataforma. A onipresença da rede cria um certo obscurecimento da realidade.
“Tudo o que é produzido por meio da máquina é máquina. Textos, imagens, filmes, discursos, programas saídos do computador são produtos maquínicos, com as devidas características: artificialmente expandidos, repletos de efeitos especiais e carregados de redundâncias. Isso devido à vontade maligna da máquina de funcionar a qualquer preço e à fascinação do operador por essa possibilidade infinita de funcionamento”, afirma o filósofo e sociólogo francês Jean Baudrillard, em uma coluna de 1996 do jornal Liberátion.
Para ele — famoso por ser uma das principais influências das irmãs Wachowski nos conceitos do filme Matrix (1999) e por ter cunhado o termo “deserto do real” —, a felicidade trazida pelo virtual só existe por “eliminar a referência às coisas” materiais. E, consequentemente, tornar os humanos que interagem com ele, “de modo automático, objetos”.
Mas as redes de vídeos curtos vão além, por darem a ilusão de ser uma via de mão dupla. É diferente de se sentar em uma sala escura para enxergar uma tela gigante. É possível interagir com publicações e também fazer os próprios vídeos.
“O consumo contínuo de conteúdos curtos causa uma reconfiguração no circuito comunicativo e na maneira como tais usuários lidam com conteúdos na cultura digital. Quando observamos a produção audiovisual contemporânea, percebemos que filmes, séries e programas televisivos cada vez mais desenvolvem estratégias estéticas e narrativas que dialogam com esses atos performativos desenvolvidos nas redes sociais”, afirma Ariane, que cita o exemplo de reality shows de culinária, que “cada vez mais contam com apelos visuais de linguagens de mídias digitais”.
Mesmo o Google, que há décadas é a principal porta para a internet, reconheceu isso. Em julho de 2022, na conferência “Brainstorm tech”, a empresa afirmou que o TikTok é uma ameaça não apenas ao YouTube, mas também ao serviço de buscas e mesmo de mapas, uma vez que os jovens usam a rede social chinesa para buscar informações e opiniões sobre os mais variados assuntos.
“Em nossos estudos, cerca de 40% dos jovens, quando procuram um lugar para almoçar, não vão ao Google Maps ou à pesquisa. Eles vão para o TikTok ou o Instagram”, revelou Prabhakar Raghavan, vice-presidente sênior do Google. A faixa etária pesquisada é de 18 a 24 anos.
Antes das redes sociais, nossa capacidade de atenção já diminuía de forma constante, segundo pesquisas. Parte da responsabilidade é da corrida armamentista para criar o aplicativo mais fechado e atrativo para o engajamento — que ocorre em termos parecidos com o atual desenvolvimento dos chatbots.
Em um estudo científico, Gloria Mark, professora de ciência da informação da Universidade da Califórnia, psicóloga e especialista em distração na interação humano-computador, revelou que trabalhadores mudam de atividade em média a cada três minutos e cinco segundos durante o expediente. Isso em 2004. Em 2012, o tempo caiu para 75 segundos de foco. Em 2021, quando ela divulgou dados mais recentes, o tempo havia caído para 47 segundos.
Não é por acaso que as big techs popularizaram de forma obsessiva o termo “economia de atenção”, que classifica a concentração humana como um bem escasso a ser explorado e precificado como mercadoria.
O conceito foi cunhado pelo economista e psicólogo Herbert Simon, em 1971, em um artigo sobre organizações em um mundo saturado de conteúdo: “[Em] um mundo rico em informação, a riqueza de conhecimento significa a escassez de outra coisa: de tudo o que a informação consome. O que a informação consome é bastante óbvio: a atenção dos seus destinatários”.
A expressão foi altamente influente na economia, na neurociência e na psicologia, mas se tornou matematicamente precisa em níveis individuais com a virtualização das relações humanas.
Somente com a tela do celular, repleta de pixels, instrumentos e códigos capazes de captar cada sinal emocional e de comportamento, a economia de atenção foi levada ao seu limite.
Bombardeado, o público sente o efeito. “Todas as redes sociais influenciam as funções executivas do cérebro — atenção, concentração e memória. O uso em horários noturnos tende a atrapalhar o sono, o que aumenta o cansaço e a distração. Os efeitos são mais fortes, provavelmente, em adolescentes. As crianças, inclusive, não deveriam usar continuamente redes sociais, e é responsabilidade dos pais evitar isso”, afirma a professora Anna King.
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