Após uma década longe do balé, Karen Ribeiro voltou a dançar aos 27 anos, em 2009. Com nível profissional, parou de praticar para buscar uma graduação formal. A então terapeuta ocupacional resgatou a vocação no balé e usou sua experiência para abrir um negócio. “Eu queria voltar a dançar balé clássico, mas não havia escolas pensadas para adultos que já fossem bailarinos, nem os que queriam começar do zero”, diz a fundadora da BalletAdultoKR, ativo há 15 anos em São Paulo.
Sedentária e em busca de uma atividade prazerosa, a assistente de marketing Ana Luiza Neves, 22, conta que a lembrança do balé na infância a fez retomar a prática em 2022. Ao documentar seu progresso no TikTok, passou a incentivar outras mulheres a testarem a dança como um hobby. “É um bom jeito de cultivar a nossa criança interior.”
Eliane Bolezina, 45, começou a fazer aulas de balé durante a licença-maternidade, aos 36 anos. Para a guarda municipal de Resende (RJ) foi a realização de um sonho. “Não sou uma excelente bailarina, mas me sinto muito feliz em poder estar nesses espaços e conseguir ter uma boa qualidade de vida.”
Apesar dos desafios iniciais, ela diz notar mudanças no equilíbrio, na flexibilidade e na concentração, que influenciam até suas aulas de jiu-jitsu.
O pedagogo Luiz Bravo, 26, sempre quis dançar, mas além da falta de condições financeiras, o morador da Baixada Fluminense, no Rio de Janeiro, se lembra de as escolas serem distantes de sua casa. Bravo diz ainda que sofreu bullying ao longo da adolescência, o que também o afastou dos esportes.
Na pandemia, quando variadas opções de aulas online surgiram, ele se arriscou no balé. A receptividade da professora foi essencial para vencer a vergonha.
“Eu tinha medo da gordofobia que sofria desde criança. O corpo se movimenta, a gordura se mexe. Eu comecei a fazer as aulas de pijama e descalço, totalmente inapropriado”, diz. Depois foi criando confiança. Neste ano, pela primeira vez, ele vestiu um collant.
Para a psicóloga Bruna Vieira, da Associação Paulista para o Desenvolvimento da Medicina, o interesse por balé na fase adulta tem a ver com um processo de redescoberta e autonomia. “A dança permite a expressão de forma criativa, o que pode ser uma válvula de escape saudável.”
A relação do balé a padrões de feminilidade e beleza, no entanto, causa impactos. “Ao tentar corresponder a essas expectativas podem surgir uma autoimagem negativa, distúrbios alimentares ou estresse. Além disso, homens podem se sentir desencorajados de perseguirem suas paixões devido aos padrões de masculinidade”, afirma Vieira.
Apesar dos estigmas atribuídos à prática, a fisioterapeuta e professora de balé Carol Lima, diz não haver idade ou tipo físico certos para quem se interessa pela dança. “O corpo de uma pessoa adulta tem registros de padrões de movimento e de lesões, mas deve ser visto como um corpo com bagagem, e não com limitações.”
O mesmo pensa a fundadora da escola Balleterapia, Priscila Monsano. Em 2016, ela criou um método com fins terapêuticos envolvendo movimentos do balé. Com unidades nos bairros Tatuapé e Pinheiros, além do conteúdo tradicional, ela dá aulas específicas para pessoas acima de 60 anos e atende jovens que possuem lesões crônicas, como hérnias de disco.
Ambas as fisioterapeutas reforçam que o balé não substitui exercícios como correr ou fazer musculação, mas que, por promover contração isométrica dos músculos, somada à tentativa de permanecer em equilíbrio, também tem um gasto energético eficiente.
Veronica Canela, 25, procurou o balé por sentir que as idas à academia eram mais uma obrigação na rotina. A dentista conta que percebeu uma melhora em sua elasticidade e continua alimentando objetivos. “Tenho que fortalecer o pé para ter força e subir na sapatilha de ponta, que é meu sonho”, diz.
As fisioterapeutas recomendam cautela para a chegada da técnica. Para Lima, o balé gera interesse em adultos por conta do conteúdo crescente a cada aula e, justamente por isso, requer que os passos na meia-ponta estejam bem consolidados antes de avançar a uma superfície de apoio menor. De acordo com Monsano, se a ponta for inserida de forma irresponsável, há risco de lesões que podem causar tendinite e ruptura de ligamentos.
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