O ano é 2022, mas poderia ser 1985, quando o Rock in Rio estreou, no show que o Måneskin fez nesta quinta-feira. Isso porque o grupo italiano, escalado em horário nobre, logo antes do Guns N’ Roses, grande nome do dia, faz um tipo de rock retrô, que recusa as transformações da música nas últimas décadas.
O quarteto, que subiu ao palco com roupas a seu estilo, numa androginia à David Bowie, faz sua primeira passagem pelo Brasil, após surgir no reality The X Factor da Itália, vencer o festival Eurovision e estourar no TikTok com sua versão de “Beggin'”, música esquecida do Four Seasons, dos anos 1960. Mas a sensação no Parque Olímpico era de que uma parcela bem pequena do público conhecia as músicas da banda.
O show anterior no palco Mundo, do Offspring, parecia mais cheio, e era possível ver alguns clarões na plateia quando o Måneskin tocava. A exceção eram os mais aficionados, muito barulhentos nas regiões próximas ao palco.
O Måneskin começou com “Zitti e Buoni”, “In Nome del Padre” e “Mammamia”, alguns de seus sucessos em italiano que destacam a sonoridade média do grupo –riffs simples e diretos, batidas energéticas e vocais gritados. Apesar das diferenças entre português e italiano, no show isso parece ter feito pouca diferença, já que era difícil reconhecer o idioma que o vocalista Damiano David cantava, em meio ao som barulhento do grupo.
“Oi, Brasil, como vocês estão?”, disse o cantor em português algumas vezes durante o show, afirmando amar a língua falada no país e puxando alguns “vamo, caralho, porra”.
Não dá para dizer que faltou entrega e esforço dos italianos, que representam uma exceção vinda do país no palco do Rock in Rio. O Måneskin tocou a balada romântica “Coraline”, que estava fora da setlist, graças a pedidos dos fãs, se movimentou e se entregou no palco, entendendo a oportunidade de estar num espaço tão grande com tão pouco tempo de carreira e repertório curto.
Até por isso, os italianos cantaram uma versão a cappella de “Love of My Life”, do Queen, emulando a cena clássica no Rock in Rio de 1985. Soou adequado, já que a banda faz um som com a cara do que dominava o festival há quase 40 anos.
A setlist teve “Close to the Top”, “Supermodel” e “We’re Gonna Dance in Gasoline”, entre outras, mas empolgou apenas nas versões de outros artistas. E foram muitas —”My Generation”, do The Who, “Womanizer”, de Britney Spears, e “I Wanna Be Your Dog”, dos Stooges, além do Queen.
Em “Beggin'”, o público no palco Mundo pulou bateu palmas e cantou junto com o hit chiclete. Nos outros momentos, a indiferença contrastou com a vitalidade do quarteto, todos com 20 e poucos anos de idade.
Tomado como a grande revelação do rock em termos de popularidade, o Måneskin tem quase nada de renovação e parece ter sido escalado em palco e hora tão nobres mais para não desagradar aos fãs do Guns N’ Roses, maioria no dia, do que pelo próprio poderio. Para quem gosta do hard rock oitentista do Guns N’ Roses, o Måneskin soa suficientemente familiar com a banda americana.
O show acabou com “I Wanna Be Your Slave” e “Lividi Sui Gomiti”, faixas própria dos italianos, com Damiano David esgoelando, os integrantes jogados no chão do palco ou na plateia, quebrando instrumentos e chamando o público para o palco.
Até os atos de rebeldia do Måneskin têm sabor vintage. Parecem a reprodução de algo que era revolucionário e impactante décadas atrás, mas hoje são cenas de blockbusters ou de games que simulam instrumentos de rock.
De certa forma, a banda italiana faz um tipo de rock que parece gerado por algoritmo, a exemplo do que faz o Greta Van Fleet, tido como a renovação do gênero no Lollapalooza de três anos atrás. É uma música cujo trunfo não é soar original e diferente, mas muito parecido com o que já é consagrado.