Valmir Salaro, 69, é jornalista investigativo há anos, mas recentemente sofreu uma inversão de valores e, agora, os holofotes estão sobre ele. Com o lançamento do documentário “Escola Base – Um Repórter Enfrenta o Passado”, da Globoplay, o rumoroso caso da falsa denúncia de pedofilia em uma instituição de ensino em São Paulo, colocou o repórter em evidência. À época, ele foi o primeiro a noticiar.
“A todo momento, antes dos encontros, eu me perguntava como os envolvidos no caso me receberiam, se aceitariam minhas desculpas, se entenderiam o que me fez fazer aquela primeira reportagem. Então foi um processo difícil, de muita angústia.”
“O que aprendi com esse caso é que devemos sempre desconfiar, mesmo que seja uma informação oficial, como era o laudo do Instituto Médico Legal de São Paulo assinado por dois médicos legistas que informava que uma das crianças tinha sido abusada sexualmente.”
É fundamental sempre ver um caso com distanciamento e ouvir incansavelmente todos os envolvidos em uma história. O que chamamos de ‘outro lado’ no jornalismo não é só um protocolo, faz parte da apuração.
Salaro diz se arrepender de ter feito a primeira reportagem sem insistir no contato pessoal com os donos da escola e com os outros investigados que tinham sido denunciados pelas mães. “Ao ouvi-los, eu poderia ter desconfiado mais, poderia ter tido uma outra impressão daquela história que, num primeiro momento, me pareceu muito verdadeira.”
O que faltou?
Para o repórter, ficou de fora da produção uma parte bastante importante de todo o caso Escola Base: as mães que denunciaram e o delegado Edélcio Lemos, o primeiro que trabalhou no processo e depois foi retirado depois por não conseguir apresentar provas.
“Eu gostaria muito de saber como eles veem o caso hoje. Eles foram procurados, como mostra o documentário, mas não quiseram falar.”
Repercussão
Desde o lançamento do título da Globoplay, muito tem sido conversado sobre o caso e o que é mostrado. A discussão tem ganhado cada vez mais espaço nas rodas de conversas e nas redes sociais. Para Salaro, a repercussão positiva tem sido uma grata surpresa. “No lançamento, em São Paulo, recebi muito carinho da minha família, dos meus amigos da Globo e colegas jornalistas.”
“Confesso que tinha um pouco de receio em como as pessoas receberiam esse filme. Afinal, falo de uma culpa. Não sabia se as pessoas entenderiam, se ficariam com raiva. Vivemos um clima social bastante tenso. As reações das pessoas estão cada vez mais imprevisíveis. Por isso, muitas vezes me perguntava como entenderiam esse documentário.”
Por quê?
Os fatos retratados em “Escola Base – Um Repórter Enfrenta o Passado” aconteceram há 28 anos e, mesmo três décadas, Salaro viu agora a hora certa de trazer de volta o que aconteceu e enfrentar a culpa pelos erros do passado.
“Ao longo desses anos, já fui muitas vezes falar sobre o caso Escola Base em faculdades de jornalismo. E essa história também sempre foi tema de conversas com outros colegas na redação. Um desses colegas é o jornalista Alan Graça Ferreira, que trabalha comigo no ‘Fantástico’. Ele sugeriu o meu reencontro com os donos da escola para expor o que eu sentia pra eles, e sugeriu também que essa história virasse um documentário. Foram anos de conversa até eu decidir levar a sugestão para a Direção de Jornalismo da Globo. O documentário foi aprovado e, há pouco mais de um ano, começamos a produção”, concluiu.