A liberdade de expressão tem ocupado relevante espaço na pauta do Supremo Tribunal Federal, e mais um caso de extrema importância teve seu julgamento iniciado pelo plenário da corte no último dia 19 de setembro.
O tema de repercussão geral 837 fixará importantes parâmetros para casos em que a liberdade de expressão é confrontada com outros direitos fundamentais, como o direito à honra. O caso concreto que guia a discussão travada na mais alta corte do país envolve o PEA (Projeto Esperança Animal), uma organização de defesa dos direitos dos animais, e a promotora da Festa do Peão de Boiadeiro de Barretos, em São Paulo.
Depois de acusar a festa do peão de maus-tratos em virtude do uso do sedém, um artefato que se presta a fazer com que os animais saltem, a organização foi condenada a remover de seu site a menção ao evento de Barretos do rol de festejos nos quais há prática de crueldade contra animais e a pagar indenização por danos morais no valor de R$ 10 mil.
Além disso, foi proibida de divulgar em seu site a lista de patrocinadores e de contatá-los com o propósito de desestimular os incentivos e patrocínios à festa e de divulgar notícias ou posicionamentos que não apresentem a versão da promotora do evento de que não pratica maus-tratos.
A violação à liberdade de expressão nesse caso é tão gritante que a execução da decisão foi suspensa por uma decisão liminar pelo próprio STF. Agora, ao julgar o recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida, a corte terá a oportunidade de, mais uma vez, corrigir graves equívocos cometidos nas instâncias ordinárias do Judiciário e fixar parâmetros que evitem novas decisões que violem a liberdade de expressão.
Ao dizer que há maus-tratos na festa do peão, o PEA limita-se a emitir sua opinião sobre o que configura maus-tratos. Opiniões sobre fatos verdadeiros, ainda que causem prejuízo à reputação, devem ser admitidas.
Reputação é algo que se constrói. Ninguém tem direito a uma boa reputação de forma independente de seu comportamento ou dos valores que prega. É por isso que o direito à honra não significa uma proteção contra opiniões negativas.
Convocar um boicote e tentar convencer empresas a não mais patrocinar um evento nada mais são do que maneiras de expressar uma opinião. São estratégias de convencimento: não coagem ninguém a deixar de consumir ou de patrocinar.
A liberdade de expressão nos é tão preciosa porque é ela que nos permite buscar imprimir os nossos valores à sociedade. É um direito político que viabiliza a própria democracia.
O Supremo recentemente reiterou a importância do papel da imprensa no julgamento das ADIs (ações diretas de inconstitucionalidade) 6.792 e 7.055, que trataram do assédio judicial contra jornalistas e dos parâmetros para responsabilização civil da imprensa.
Agora terá a oportunidade de, mais uma vez, reforçar o conjunto de precedentes que avançaram a jurisprudência da corte, protegendo também diversas formas de expressão de opiniões —ainda que elas sejam duras, não agradem e (por que não?) possam repercutir negativamente sobre a reputação de alguém.
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