Os efeitos da atividade física no corpo funcionam como um jogo de dominó. O corpo responde ao exercício de forma imediata com adaptações no organismo que desencadeiam mais respostas e, a longo prazo, resultam na melhora das funções do corpo e da saúde como um todo.
Antes, a ciência acreditava que os benefícios só apareciam depois de dois ou três meses de prática. Isso é uma meia-verdade, explica Bruno Gualano, presidente do Centro de Medicina do Estilo de Vida da Faculdade de Medicina da USP (Universidade de São Paulo) e colunista da Folha.
Há ferramentas científicas que detectam essas mudanças somente após um certo período, de acordo com Gualano. E também é verdade que o corpo precisa de uma rotina ativa e da prática regular de exercícios para sofrer mudanças estruturais.
Os benefícios, porém, não surgem magicamente depois de dois ou três meses. Ajustes metabólicos e fisiológicos acontecem a partir do momento em que se começa a fazer atividade física, afirma o professor da USP.
“Quando eu digo isso, eu me refiro literalmente ao início da atividade. Se eu começar a correr agora, alterações metabólicas começam a acontecer”, diz Gualano. “Isso desencadeia alterações nos genes em períodos de dias a semanas. Depois, esses genes se traduzem em proteínas, até que a gente tenha uma alteração que a gente chama de fenotípica.”
As alterações fenotípicas são, de fato, o resultado da atividade física. Um aumento da massa muscular, por exemplo, ou um ganho de capacidade cardiovascular —quando você faz uma caminhada e sente-se menos cansado, com mais fôlego.
Esse efeito imediato pode ser um incentivo para quem tem dificuldade em manter o hábito: nunca deixe de tentar de novo. Uma única sessão de exercício desencadeia pequenas alterações no organismo e pode ser a primeira peça no dominó de uma saúde melhor.
Ao fim do exercício, o corpo inicia um processo de recuperação e adaptação, relata Diogo Figueiredo Souza, médico do exercício e do esporte do Hospital Israelita Albert Einstein. Há uma redução na pressão arterial por um aumento da dilatação dos vasos sanguíneos nos músculos que foram exercitados.
Após uma única sessão de treinamento, também é possível ter um controle inicial da glicemia [nível de açúcar no sangue], complementa Daniela Agostinho, educadora física e especialista em reabilitação cardíaca no Hospital Sírio-Libanês.
A atividade física tem ainda efeitos diretos no cérebro, uma vez que neurotransmissores como dopamina, noradrenalina e serotonina são liberados e garantem uma sensação de bem-estar após a prática.
O metabolismo permanece elevado por um período, de acordo com Figueiredo, em um fenômeno conhecido como “excess post-exercise oxygen consumption” [consumo excessivo de oxigênio pós-exercício], promovendo maior queima de calorias.
Todas essas alterações, quando repetidas de forma contínua, geram melhoras nos padrões de funcionamento do organismo.
Além da maior eficiência dos músculos —incluindo o coração—, há benefícios sistêmicos, como melhora no perfil lipídico [colesterol e triglicerídeos], controle da glicemia, redução da inflamação crônica e fortalecimento do sistema imunológico, lista o médico do Einstein.
Ocorre ainda uma redução do risco de doenças metabólicas, como diabetes, cardiovasculares, como infarto e AVC, de câncer e de doenças psicológicas, como depressão e ansiedade, complementa Figueiredo.
No dia a dia, a pessoa passa a sentir-se menos cansada, com mais disposição e mobilidade, melhora na qualidade do sono, redução de estresse e até melhoras no funcionamento do intestino.
Quatro capacidades físicas são potencializadas com a prática de exercícios, de acordo com o Guia de Atividade Física para a População Brasileira, do Ministério da Saúde. São elas:
1. Aptidão cardiorrespiratória
É a capacidade que ajuda você a se deslocar ou fazer as atividades do seu dia a dia sem ficar cansado
2. Força
É a capacidade que ajuda você a carregar as sacolas do supermercado ou algum objeto
3. Flexibilidade
É a capacidade que ajuda você a se vestir ou agachar para pegar algum objeto no chão sem dificuldades
4. Equilíbrio
É a capacidade que ajuda você a manter sua postura e sustentar seu corpo
O que a ciência indica
As diretrizes da OMS (Organização Mundial da Saúde) recomendam, para adultos e idosos, pelo menos de 150 a 300 minutos por semana de atividade física moderada ou de 75 a 150 minutos de atividade vigorosa. Esses grupos também devem realizar atividades de fortalecimento muscular em, pelo menos, dois dias na semana.
A OMS define atividade física como “qualquer movimento corporal produzido pelos músculos esqueléticos que requer gasto de energia”, o que inclui também transporte, atividades de trabalho ou domésticas.
Já o exercício é uma atividade planejada e estruturada, com um objetivo —por exemplo, ganhar massa muscular ou ter mais flexibilidade. Ou seja, todo exercício é atividade física, mas nem toda atividade física é exercício.
A ciência usa ferramentas específicas para classificar uma atividade como de baixa intensidade, moderada ou vigorosa. Mas é possível diferenciá-las a partir de sinais fisiológicos como sudorese (suor) e frequência cardíaca e respiratória. Suar e ficar ofegante são indícios de um aumento no esforço, ou seja, na intensidade da atividade, explica Gualano.
Numa caminhada leve, por exemplo, você consegue conversar e até cantar durante o exercício, diz Figueiredo. No nível moderado, ainda é possível falar, com mais dificuldade, mas cantar, não. Em uma corrida vigorosa, conversar com o colega torna-se difícil ou impossível.
A intensidade influencia os efeitos. “Exercícios leves são úteis para manutenção da saúde e recuperação ativa. Moderados melhoram a capacidade aeróbica e cardiovascular. Já os intensos trazem adaptações rápidas, como aumento da força e potência muscular, melhora da capacidade aeróbica, mas requerem maior tempo de recuperação e controle para evitar lesões ou excessos”, explica o médico.
Quando possível, o melhor dos cenários é ter uma rotina de exercícios planejada, que inclua treinos de força —como musculação ou pilates— e aeróbios —como caminhada, corrida ou ciclismo— distribuídos ao longo da semana.
Para isso, é preciso ter tempo de lazer, algo que falta para muitos, comenta Gualano. “A gente também tem que ter esse cuidado para não colocar todo o peso da atividade física no ombro do indivíduo”, diz.
Os especialistas reforçam a importância de não se frustrar caso não seja possível alcançar o mínimo recomendado. “Fazer alguma atividade física é a porta de entrada para o universo do movimento e do exercício”, defende o professor.